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2.5.11

O Esplendor da Juventude 

Publicado originalmente no jornal "O Diabo"

Henrique Silveira – crítico

Gustav Mahler Jugendorchester com direcção de Philippe Jordan, tenor Burkhard Fritz e barítono Thomas Hmpson, Domingo 17 de Abril, Fundação Gulbenkian, Adagio da Sinfonia nº 10 e Canção da Terra de Gustav Mahler.

No centenário da morte de Mahler a orquestra juvenil que se refunda todos os anos com mais de uma centena dos jovens músicos mais prometedores da Europa volta à sua digressão de Páscoa. Portugal participou com Pedro Fernandes na trompa e Filipe Alves no trombone. Note-se a elevada proporção de jovens de países da mesma ou menor dimensão que a nossa, como Bélgica, Eslováquia ou Estónia, que contribuem com mais músicos. Por outro lado a Espanha tem um largo número de cordas na orquestra e Portugal tem zero músicos neste sector. É um barómetro de como vai mal o ensino da música em Portugal.

O concerto começou com o desesperado adagio da sinfonia que Mahler nunca veio a concluir. O Adagio seria o primeiro andamento. A obra foi tocada com um amor pela música que chegou a ser avassalador, é certo que alguns pizzicati saíram pouco exactos, é certo que, numa tessitura muito ingrata, as violas estiveram quase perfeitas com excepção de uma desafinação pontual, é certo que algumas entradas não foram milimétricas nos metais graves, mas a beleza da entoação, o equilíbrio notável de uma formação tão jovem com uma grande densidade nas cordas, em maior número do que numa formação habitual, e um belíssimo som nas madeiras, deixaram o público de rastos. A direcção muito inspirada e poética de Jordan, apenas com as mãos, criou momentos de grande intensidade dramática e também de grande lirismo. Mahler confrontado com a traição de uma mulher, que nunca o entendeu, e a doença mortal despediu-se desta terra com estes compassos tão bem entendidos por estes jovens, notável.

A Canção da Terra, de facto são seis canções sinfónicas agrupadas numa obra coerente, foi o corolário perfeito este concerto especial. A obra tem uma grande intensidade e exige um grande tenor, com agilidade, potência e brilho; um tenor completo, que seja capaz de um bom piano e de fortíssimos rutilantes, de poesia, de ironia e de virtuosismo. Fritz, um alemão do norte, começou frio e com dificuldades vocais de emissão e entoação na primeira canção mas à medida que aqueceu mostrou ter todas as qualidades mencionadas acima, precisa apenas de melhorar no domínio da suavidade vocal.

Thomas Hampson que, no meu entender, nem tem uma voz muito bela em termos de timbre, construiu uma narrativa coerente e empolgante, perfeito na dicção e na forma de dizer poesia, Hampson foi o poeta chinês que Mahler transformou em música. Com domínio total do papel, e da respiração, foi apenas um pouco ácido nos graves em termos de afinação, teve confiança total na emissão. Acabou numa “Despedida”, último lied do ciclo, tão bela que atingiu o indizível e nos comoveu, mostrando uma qualidade superlativa.

E o encanto da juventude perdurou na nossa memória e levou-nos aos tempos de Mahler e da sua vida tão complicada quando foi bela a sua música. Bravo jovens músicos.

*****

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