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20.3.11

Orquestra Sinfónica Portuguesa I 

Publicado originalmente no jornal "O Diabo"
Henrique Silveira – crítico

Mega Ferreira, presidente do CCB, anunciou com pompa e circunstância que a obra Daphnis et Chloé de Maurice Ravel seria apresentada nos Dias da Música, esse sucedâneo da Festa da Música, mais pobrezinho que o evento anterior e baseado fundamentalmente nos mesmos princípios. A obra de Ravel é extraordinária, é necessário um grande refinamento da orquestra e do coro.

A obra vai ser entregue à Orquestra Sinfónica Portuguesa, o que me levou a esta reflexão. Pois fique sabendo que a orquestra custa mais de cinco milhões ao Estado por ano, foi fundada em 1993 e nunca se conseguiu afirmar como uma orquestra razoável sequer no plano português sem falar do plano internacional. Desde a sua criação a Orquestra Sinfónica Portuguesa nunca se livrou de alguns problemas que assolaram a sua existência.

Em primeiro lugar a esquizofrenia de ser uma orquestra de ópera e ao mesmo tempo uma orquestra de concertos, os seus 110 elementos nunca se encontram em conjunto para fazer ópera e nos períodos em que há ópera não se fazem concertos. Se em Viena a Filarmónica, associação livre de músicos do teatro de ópera, se reúne nos seus tempos livres para ensaiar e fazer concertos aos Domingos, com uma carga enorme de trabalho que conjuga mais de 300 noites de ópera com dezenas de concertos, a sinfónica portuguesa terá cinquenta noites de ópera e uma vintena de concertos anuais, com uma produtividade baixíssima. No entanto os seus padrões de qualidade são tão baixos que seria impossível uma maior produção, acresce a isso que a orquestra portuguesa não consegue fixar repertório devido o número ínfimo de vezes que se apresenta em público.

Em segundo lugar esta orquestra tem sido desprezada pelo poder político e por todas as tutelas, sem excepção, desde a sua criação. Não tem uma sala de concertos própria, o que a par da sua falta de qualidade, tem contribuído para um total desfasamento do público. Por outro lado não tem salas de ensaio, estudo, biblioteca, ou gabinetes de trabalho e estúdios para os músicos desenvolverem as suas actividades relacionadas com a orquestra e paralelas e nem sequer espaços de arrumações dignos desse nome têm para guardar instrumentos que podem ser volumosos. Andam com a casa à costas ensaiando onde calha, muitas vezes no impróprio Salão Nobre do Teatro de S. Carlos.

Finalmente a orquestra não tem na sua constituição músicos verdadeiramente excepcionais e não há qualquer avaliação de desempenho. Os lugares são de funcionalismo público, seguros e para sempre. Toquem bem ou mal ninguém os repreende. As críticas eram penosas no início mas a coisa está tão estagnada que os críticos já nem se dão ao trabalho de ir aos concertos e nas críticas das ópera andam pela condescendência e evitam referir-se à orquestra.

Desde 1993 nunca a orquestra evoluiu, os críticos internacionais com quem tenho falado dizem-me sempre: que pena, a vossa orquestra nacional é tão fraca... Se no Índice de Desenvolvimento Humano Portugal aparece pelo lugar 30 a nossa orquestra nacional terá à frente, e de longe, mais de trezentas orquestras, o que diz bem do estado de coisas da orquestra pública.
Continua.

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