4.6.11
O Fagote de Veludo
Texto Publicado originalmente no jornal "O Diabo"
Henrique Silveira – crítico
Carl Maria von Weber: andante e rondó húngaro para viola e orquestra, op. 35, concertos para Fagote e orquestra op. 75 e concerto nº2 para clarinete e orquestra op. 74. Beethoven: concerto para violino op. 61. Samuel Barseguian na viola, Ricardo Ramos no fagote, Esther Georgie no clarinete e Frank Peter Zimmermann no violino. Quinta 19 de Maio na Fundação Gulbenkian com casa meia, direcção de Lawrence Foster. Orquestra Gulbenkian.
A obra inicial fez-me lembrar esta anedota: “Como se sabe quando a viola está fora de tom? É quando o arco se move!” E assim foi: o solista mostrou sonoridade fraca e esteve constantemente desafinado, foi pouco interessante em termos musicais com um fraseado altamente monótono. Sofri particularmente com as cordas ré e lá. Um mau início.
O belo concerto de Weber para fagote foi uma revelação. O solista português Ricardo Ramos foi muito afirmativo, confiante, com uma sonoridade cheia e aveludada, rico nos graves e médios e brilhante nos agudos. A sua musicalidade foi evidente na poesia do segundo andamento e foi poderoso no terceiro. O seu som firme e bonito serviu uma inteligência musical que deu interesse e surpresa às frases de Weber e disfarçou com ligeireza uma única hesitação no primeiro andamento. Uma grande elegância no legato e um staccato muito claro foram elementos técnicos que me impressionaram vivamente.
Já Eshter Georgie no clarinete desiludiu. A obra de Weber não é compatível com um staccato trapalhão, articulações erráticas e falta de brilho sonoro, muito evidente nas sextinas finais. Dir-se-ia que Georgie é incapaz de forte e fortíssimo. Improvisando nas ornamentações no primeiro andamento, facto que não repetiu nos seguintes, teve como elementos fortes uma grande doçura no som, belíssimos pianíssimos e um poético segundo andamento que compensou, de certa forma, os defeitos dos andamentos rápidos.
O concerto de violino de Beethoven teve um Zimmermann que me pareceu cansado de tocar em público. Vim a saber posteriormente que estava indisposto. Os pontapés no chão ao mesmo tempo que toca desequilibram e descontrolam o som, facto que ocorreu diversas vezes. No entanto deu o mote à orquestra nas articulações enérgicas e nas arcadas decididas e o seu som é belíssimo. O primeiro andamento, que costuma ser arrastado até à exaustão por solistas menos dotados, foi um modelo de energia e propulsão. Percebe-se que mesmo adoentado Zimmermann é um grande músico.
A direcção de Foster foi errática e imprecisa, uma espécie de mistura de gestos de sinaleiro com a violência de um “diestro tourero”, mas a eficácia é reduzida para tanto espalhafato e de Weber a Beethoven houve desencontros. Pede-se ainda mais atenção ao contrabaixo que no concerto para clarinete de Weber, terceiro andamento, teve uma falsa entrada em fortíssimo em vez de piano: uma sapatada musical que fez saltar o público da última fila!
***
Henrique Silveira – crítico
Carl Maria von Weber: andante e rondó húngaro para viola e orquestra, op. 35, concertos para Fagote e orquestra op. 75 e concerto nº2 para clarinete e orquestra op. 74. Beethoven: concerto para violino op. 61. Samuel Barseguian na viola, Ricardo Ramos no fagote, Esther Georgie no clarinete e Frank Peter Zimmermann no violino. Quinta 19 de Maio na Fundação Gulbenkian com casa meia, direcção de Lawrence Foster. Orquestra Gulbenkian.
A obra inicial fez-me lembrar esta anedota: “Como se sabe quando a viola está fora de tom? É quando o arco se move!” E assim foi: o solista mostrou sonoridade fraca e esteve constantemente desafinado, foi pouco interessante em termos musicais com um fraseado altamente monótono. Sofri particularmente com as cordas ré e lá. Um mau início.
O belo concerto de Weber para fagote foi uma revelação. O solista português Ricardo Ramos foi muito afirmativo, confiante, com uma sonoridade cheia e aveludada, rico nos graves e médios e brilhante nos agudos. A sua musicalidade foi evidente na poesia do segundo andamento e foi poderoso no terceiro. O seu som firme e bonito serviu uma inteligência musical que deu interesse e surpresa às frases de Weber e disfarçou com ligeireza uma única hesitação no primeiro andamento. Uma grande elegância no legato e um staccato muito claro foram elementos técnicos que me impressionaram vivamente.
Já Eshter Georgie no clarinete desiludiu. A obra de Weber não é compatível com um staccato trapalhão, articulações erráticas e falta de brilho sonoro, muito evidente nas sextinas finais. Dir-se-ia que Georgie é incapaz de forte e fortíssimo. Improvisando nas ornamentações no primeiro andamento, facto que não repetiu nos seguintes, teve como elementos fortes uma grande doçura no som, belíssimos pianíssimos e um poético segundo andamento que compensou, de certa forma, os defeitos dos andamentos rápidos.
O concerto de violino de Beethoven teve um Zimmermann que me pareceu cansado de tocar em público. Vim a saber posteriormente que estava indisposto. Os pontapés no chão ao mesmo tempo que toca desequilibram e descontrolam o som, facto que ocorreu diversas vezes. No entanto deu o mote à orquestra nas articulações enérgicas e nas arcadas decididas e o seu som é belíssimo. O primeiro andamento, que costuma ser arrastado até à exaustão por solistas menos dotados, foi um modelo de energia e propulsão. Percebe-se que mesmo adoentado Zimmermann é um grande músico.
A direcção de Foster foi errática e imprecisa, uma espécie de mistura de gestos de sinaleiro com a violência de um “diestro tourero”, mas a eficácia é reduzida para tanto espalhafato e de Weber a Beethoven houve desencontros. Pede-se ainda mais atenção ao contrabaixo que no concerto para clarinete de Weber, terceiro andamento, teve uma falsa entrada em fortíssimo em vez de piano: uma sapatada musical que fez saltar o público da última fila!
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Etiquetas: Crítica de Concertos, Gulbenkian, Orquestra Gulbenkian
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