10.4.11
O Teatro de Mehta
Publicado originalmente no Jornal "O Diabo"
Henrique Silveira – crítico
Orquestra do Maio Musical Florentino, direcção de Zubin Mehta, novo Palácio das artes de Budapeste. Aberturas de Verdi, Vésperas Sicilianas, Luísa Miller e A Força do Destino na primeira parte, segunda parte com a Sinfonia nº1 de Mahler e extras: dança húngara nº5 de Brahms e Intermezzo da Cavalaria Rusticana de Mascagni. Concerto a 2 de Abril, sala cheia com 1700 lugares.
A primeira parte serviu para aquecer e encher. As aberturas de Verdi foram tocadas com alguma paixão, talvez com a excepção da Luisa Miller um pouco mais arrastada do que seria espectável. Gostámos sobretudo do primeiro clarinete, simplesmente brilhante nos seus solos e de um apropriado Cimbasso italiano no naipe dos trombones a fazer a parte mais graves. Os vinte e cinco minutos iniciais passaram depressa.
A sinfonia nº1 de Mahler é música de menor fluência para a orquestra italiana do que o idiomático Verdi. Aqui devia sentir-se a batuta de um grande maestro. Infelizmente a sucessão de erros técnicos e artísticos deixou muitas dúvidas da actual qualidade da orquestra e, sobretudo, das qualidades de Mehta em Mahler. Desafinações nos primeiros violinos nas notas mais agudas, sforzandi anémicos, falta de equilíbrio sonoro entre metais graves e resto da orquestra, trompas graves com som feio, um solo de contrabaixo tocado com notas ao lado no quarto andamento, vibrato caprino na primeira flauta, notas erradas massacrando a harmonia nas trompas e falta de som nos violinos foram constantes em Mahler.
No entanto, o mais constrangedor foi o teatro expressivo de Mehta, com amplos e belos gestos, mas com pouca eficácia e sem se dar ao trabalho de dar entradas. Isso foi notório nos momentos mais líricos, em que o maestro fazia uma pantomina muito inspirada mas da orquestra saia um som descoordenado e pouco poético.
O primeiro andamento não teve nem mistério nem clímax, e acabou a arrastar-se penosamente sem capacidade de arranque no final. É espectável o público ficar sem fôlego mas apenas os músicos ficaram ofegantes. O segundo andamento foi frouxo e monótono. O terceiro foi trapalhão e desinteressante. O quarto foi o pior, o famoso Frère Jacques foi destruído pelo contrabaixo seguindo-se uma inenarrável confusão e descoordenação, cuja única explicação será a falta de trabalho e falta de ensaios. O final foi agressivo e pesado e a poesia nunca esteve presente, o barulho e as notas erradas das trompas foram tónica e dominante.
Gostámos muito do naipe dos fagotes, dos clarinetes e das violas. Os violinos com um concertino com pouca personalidade, o solista em flauta com um som horrendo e um mau e desatento naipe de trompas foram o pior da orquestra, o resto foi sofrível. A orquestra de Florença esteve a um nível inferior ao exigível numa formação com a sua história.
Após aplausos entusiásticos misturados com poucos, mas audíveis, apupos Mehta teve o descaramento de dar dois extras: uma banalíssima e desinteressante Dança Húngara de Brahms, com muito pouca cor e pouco contraste e um belíssimo intermezzo de Mascagni que mitigou um pouco o sofrimento. Mehta fez o seu teatro e lá vai andando ao seu ritmo de cruzeiro desfrutando de uma fama e de um mediatismo que não tem paralelo com o trabalho produzido. Mahler escreveu que a chave da sua interpretação era a exactidão e o que estava para além das notas e, neste caso, não se obteve nem uma coisa nem outra.
*
o - Mau, * - sofrível, ** - interessante, *** - bom, **** - muito bom, ***** - excepcional.
Henrique Silveira – crítico
Orquestra do Maio Musical Florentino, direcção de Zubin Mehta, novo Palácio das artes de Budapeste. Aberturas de Verdi, Vésperas Sicilianas, Luísa Miller e A Força do Destino na primeira parte, segunda parte com a Sinfonia nº1 de Mahler e extras: dança húngara nº5 de Brahms e Intermezzo da Cavalaria Rusticana de Mascagni. Concerto a 2 de Abril, sala cheia com 1700 lugares.
A primeira parte serviu para aquecer e encher. As aberturas de Verdi foram tocadas com alguma paixão, talvez com a excepção da Luisa Miller um pouco mais arrastada do que seria espectável. Gostámos sobretudo do primeiro clarinete, simplesmente brilhante nos seus solos e de um apropriado Cimbasso italiano no naipe dos trombones a fazer a parte mais graves. Os vinte e cinco minutos iniciais passaram depressa.
A sinfonia nº1 de Mahler é música de menor fluência para a orquestra italiana do que o idiomático Verdi. Aqui devia sentir-se a batuta de um grande maestro. Infelizmente a sucessão de erros técnicos e artísticos deixou muitas dúvidas da actual qualidade da orquestra e, sobretudo, das qualidades de Mehta em Mahler. Desafinações nos primeiros violinos nas notas mais agudas, sforzandi anémicos, falta de equilíbrio sonoro entre metais graves e resto da orquestra, trompas graves com som feio, um solo de contrabaixo tocado com notas ao lado no quarto andamento, vibrato caprino na primeira flauta, notas erradas massacrando a harmonia nas trompas e falta de som nos violinos foram constantes em Mahler.
No entanto, o mais constrangedor foi o teatro expressivo de Mehta, com amplos e belos gestos, mas com pouca eficácia e sem se dar ao trabalho de dar entradas. Isso foi notório nos momentos mais líricos, em que o maestro fazia uma pantomina muito inspirada mas da orquestra saia um som descoordenado e pouco poético.
O primeiro andamento não teve nem mistério nem clímax, e acabou a arrastar-se penosamente sem capacidade de arranque no final. É espectável o público ficar sem fôlego mas apenas os músicos ficaram ofegantes. O segundo andamento foi frouxo e monótono. O terceiro foi trapalhão e desinteressante. O quarto foi o pior, o famoso Frère Jacques foi destruído pelo contrabaixo seguindo-se uma inenarrável confusão e descoordenação, cuja única explicação será a falta de trabalho e falta de ensaios. O final foi agressivo e pesado e a poesia nunca esteve presente, o barulho e as notas erradas das trompas foram tónica e dominante.
Gostámos muito do naipe dos fagotes, dos clarinetes e das violas. Os violinos com um concertino com pouca personalidade, o solista em flauta com um som horrendo e um mau e desatento naipe de trompas foram o pior da orquestra, o resto foi sofrível. A orquestra de Florença esteve a um nível inferior ao exigível numa formação com a sua história.
Após aplausos entusiásticos misturados com poucos, mas audíveis, apupos Mehta teve o descaramento de dar dois extras: uma banalíssima e desinteressante Dança Húngara de Brahms, com muito pouca cor e pouco contraste e um belíssimo intermezzo de Mascagni que mitigou um pouco o sofrimento. Mehta fez o seu teatro e lá vai andando ao seu ritmo de cruzeiro desfrutando de uma fama e de um mediatismo que não tem paralelo com o trabalho produzido. Mahler escreveu que a chave da sua interpretação era a exactidão e o que estava para além das notas e, neste caso, não se obteve nem uma coisa nem outra.
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o - Mau, * - sofrível, ** - interessante, *** - bom, **** - muito bom, ***** - excepcional.
Etiquetas: Crítica, Crítica de Concertos, Zubin Mehta
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