9.5.06
Pérolas em programas da Gulbenkian - n
De Paula Gomes Ribeiro:
..."A axiomática crueldade do Ser."... Uma frase sem sujeito e sem verbo! Qual o sentido de "axiomática" na crueldade do ser? Será que a crueldade do ser é sempre axiomática como se depreende do texto? Seremos, por definição axiomática, entes da crueldade ingénita? Mas quem postula esta axiomática, o próprio ser cruel que é o homem? Discutível? Muito. Palavra mal usada num contexto pretensamente intelectual na tentativa de credibilizar um discurso com ornamentos supérfluos de um estilo arrevesado e gongórico? Parece-me apenas uma espécie de ganga repelente do jargão dos profissionais da estética, absolutamente desfasados da realidade e absolutamente inapropriada numas notas de programa para serem lidas por não especialistas. A propósito ler Brian Magee sobre o assunto, o professor de Oxford faz-nos notar que a clareza da exposição está sempre associada à clareza de ideias...
Poderia ser também:
A crueldade axiomática do Ser.
O Ser axiomaticamente cruel.
A ideia já foi exposta a continuação deste texto é para ler apenas por divertimento. É uma divagação.
Vejamos um exemplo de gongorização de uma frase comum:
Cruel axiomático este Ser e este conglomerado de gadus com pómeas tuberculinas também é axiomaticamente cruel, numa inclemência idiossincrática da aprendiz de Escofier que preparou tão requintado pitéu que nos leva a uma divagação epistemológica sobre as exegeses culinárias neste pós modernismo tão retirado de excelências ultrapassadas de um kitsch de tempos mitológicos e mesmo heróicos. A crueldade para um pós moderno de aceitar este bolinho gadulínio como uma essência retardade de um período em que a alteridade empática era regulada por conceitos absolutos e mesmo utópicos é deveras sintomática da nossa essência humana, demasiadamente humana. Ah! Hodierna pós modernidade que recusa a aceitação destes prazeres entre o Eros do paladar e o Thanatos dos colesterois e da sensação de recusa intelectual da gadolínea vitualha pouco digna de um palato requintado de um apolíneo esteta...
Tradução: O pastel de bacalhau, feito por uma boa cozinheira, é, por definição, cruelmente bom para um professor universitário, mas este recusa em assumi-lo por ser um petisco demasiadamente popular e pouco intelectualizado, além disso hesita entre o prazer do gosto e a ameaça de morte do colesterol e afins...
Era o que eu queria dizer, mas como gongorizei o texto a clareza perdeu-se, pode-se entender também que o pastel de bacalhau estava retardado, ou que é uma resto moribundo de um tempo ultrapassado ou ainda que a cozinheira não presta (no que poderia ser uma leitura irónica mas com a pista reveladora "aprendiz"), aceitam-se outras traduções...
O corolário destas diatribes estético-gongóricas vem na sequência do texto das notas de programa de Paula Gomes Ribeiro: "Estas figuras, que surgem como essências musicodramáticas, fazem emergir toda a vitalidade de uma alteridade interna. As técnicas literárias e musicais tornam-se cúmplices na edificação de introspecções, através de densas exegeses sobre a violência da dimensão oculta do Ser".
Já Jorge Calado no Expresso referenciou esta última frase, como tenho mais espaço recorro à utilização para esta análise das duas frases citadas que se sucedem, "alteridade interna" a quê ou a quem? À obra? Ao ser abstracto, global? Ao ser concreto? Ao agente personagem? Ao "eu" falado no parágrafo anterior? Ao "eu" da personagem, que de facto não existe, como a autora deve bem saber, existe a projecção da personagem no receptor ou o "eu" do autor, mas nunca o "eu" da personagem que associa ao tal "ente transgressivo". E as figuras musicodramáticas, que são os tais "entes transgressivos", afinal ficamos onde? Pomposo, ridículo e sobretudo: muito pouco claro. A última sentença é tão lapidar que nem merece comentários. O facto de ser professor universitário fez-me deparar, em anos de leituras de trabalhos, com textos em que os autores mascaravam uma confrangedora falta de capacidade de comunicação das ideias, e mesmo de ideias, o que não parece ser o caso, por detrás de construções abstrusas e pretensamente eruditas.
Paula Gomes Ribeiro: liberte-se, explique o quer dizer sem preconceitos, eu acho que até escreve bem e as ideias lá fundo até parecem ser boas, mas a ganga de gongorismos apenas leva ao riso. E uma coisa é certa: rir é muito agradável e já dei umas gargalhadas ao ler o seu texto e a escrever este...
..."A axiomática crueldade do Ser."... Uma frase sem sujeito e sem verbo! Qual o sentido de "axiomática" na crueldade do ser? Será que a crueldade do ser é sempre axiomática como se depreende do texto? Seremos, por definição axiomática, entes da crueldade ingénita? Mas quem postula esta axiomática, o próprio ser cruel que é o homem? Discutível? Muito. Palavra mal usada num contexto pretensamente intelectual na tentativa de credibilizar um discurso com ornamentos supérfluos de um estilo arrevesado e gongórico? Parece-me apenas uma espécie de ganga repelente do jargão dos profissionais da estética, absolutamente desfasados da realidade e absolutamente inapropriada numas notas de programa para serem lidas por não especialistas. A propósito ler Brian Magee sobre o assunto, o professor de Oxford faz-nos notar que a clareza da exposição está sempre associada à clareza de ideias...
Poderia ser também:
A crueldade axiomática do Ser.
O Ser axiomaticamente cruel.
A ideia já foi exposta a continuação deste texto é para ler apenas por divertimento. É uma divagação.
Vejamos um exemplo de gongorização de uma frase comum:
Cruel axiomático este Ser e este conglomerado de gadus com pómeas tuberculinas também é axiomaticamente cruel, numa inclemência idiossincrática da aprendiz de Escofier que preparou tão requintado pitéu que nos leva a uma divagação epistemológica sobre as exegeses culinárias neste pós modernismo tão retirado de excelências ultrapassadas de um kitsch de tempos mitológicos e mesmo heróicos. A crueldade para um pós moderno de aceitar este bolinho gadulínio como uma essência retardade de um período em que a alteridade empática era regulada por conceitos absolutos e mesmo utópicos é deveras sintomática da nossa essência humana, demasiadamente humana. Ah! Hodierna pós modernidade que recusa a aceitação destes prazeres entre o Eros do paladar e o Thanatos dos colesterois e da sensação de recusa intelectual da gadolínea vitualha pouco digna de um palato requintado de um apolíneo esteta...
Tradução: O pastel de bacalhau, feito por uma boa cozinheira, é, por definição, cruelmente bom para um professor universitário, mas este recusa em assumi-lo por ser um petisco demasiadamente popular e pouco intelectualizado, além disso hesita entre o prazer do gosto e a ameaça de morte do colesterol e afins...
Era o que eu queria dizer, mas como gongorizei o texto a clareza perdeu-se, pode-se entender também que o pastel de bacalhau estava retardado, ou que é uma resto moribundo de um tempo ultrapassado ou ainda que a cozinheira não presta (no que poderia ser uma leitura irónica mas com a pista reveladora "aprendiz"), aceitam-se outras traduções...
O corolário destas diatribes estético-gongóricas vem na sequência do texto das notas de programa de Paula Gomes Ribeiro: "Estas figuras, que surgem como essências musicodramáticas, fazem emergir toda a vitalidade de uma alteridade interna. As técnicas literárias e musicais tornam-se cúmplices na edificação de introspecções, através de densas exegeses sobre a violência da dimensão oculta do Ser".
Já Jorge Calado no Expresso referenciou esta última frase, como tenho mais espaço recorro à utilização para esta análise das duas frases citadas que se sucedem, "alteridade interna" a quê ou a quem? À obra? Ao ser abstracto, global? Ao ser concreto? Ao agente personagem? Ao "eu" falado no parágrafo anterior? Ao "eu" da personagem, que de facto não existe, como a autora deve bem saber, existe a projecção da personagem no receptor ou o "eu" do autor, mas nunca o "eu" da personagem que associa ao tal "ente transgressivo". E as figuras musicodramáticas, que são os tais "entes transgressivos", afinal ficamos onde? Pomposo, ridículo e sobretudo: muito pouco claro. A última sentença é tão lapidar que nem merece comentários. O facto de ser professor universitário fez-me deparar, em anos de leituras de trabalhos, com textos em que os autores mascaravam uma confrangedora falta de capacidade de comunicação das ideias, e mesmo de ideias, o que não parece ser o caso, por detrás de construções abstrusas e pretensamente eruditas.
Paula Gomes Ribeiro: liberte-se, explique o quer dizer sem preconceitos, eu acho que até escreve bem e as ideias lá fundo até parecem ser boas, mas a ganga de gongorismos apenas leva ao riso. E uma coisa é certa: rir é muito agradável e já dei umas gargalhadas ao ler o seu texto e a escrever este...
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