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25.4.06

Concertos de Domingo na Festa da Música - III 

Concerto 82
Pequeno Auditório 16h15
Carlos Mena contratenor
François Fernandez viola de amor
Ricercar Consort
Philippe Pierlot direcção
Vivaldi: Stabat Mater em Fá menor RV 621
Vivaldi: Concerto para viola de amor em Ré menor F II nº 2
Vivaldi: Nisi Dominus RV 608

Assisti ao Stabat Mater de Vivaldi com Carlos Mena. Devo dizer que a repetição do concerto de há três anos talvez fosse desnecessária uma vez que poderíamos ter aproveitado para escutar Mena noutro repertório. Mais uma vez o cantor e o agrupamento de Pierlot foram notáveis. Mena está cada vez mais refinado e com mais estilo.
Um grande contratenor num momento memorável de maturidade e qualidade vocal. Voz de grande beleza tímbrica, de naturalidade musical e de expressividade. Domínio do texto do Stabat Mater transmitindo profunda emoção. O Ricercar consort mostrou-se à altura do acontecimento, moldando-se com plasticidade ao dizer e à retórica de Mena. Uma conjugação de cultura musical, cultura literária e técnica perfeitas.
Um dos grandes concertos deste ano. N.T. 18, N.A. 18.

Concerto 107. Sala La Pouplinière 18h15
La Venexiana
Claudio Cavina direcção
Scarlatti: Salve Regina em Lá menor
Scarlatti: Stabat Mater

Um dos textos litúrgicos (a par do Stabat Mater) mais belos que existem. Claudio Cavina, contratenor, e Roberta Mameli, soprano, apresentaram o Salve Regina de D. Scarlatti. A interpretação algo a frio não foi totalmente conseguida, com ligeiros desacertos de afinação. No entanto o texto do Salve Regina foi cantado com invulgar religiosidade e emoção.
O ponto mais elevado viria a seguir com o extraordinário Stabat Mater a dez vozes e baixo contínuo, escrito ainda em Roma, segundo Claudio Cavina ou ainda Jürgen Jürgens supõem, parece que surgem outras teorias mais recentes, como o musicólogo J.P. Alvarenga nos explicou que, provavelmente, terão base documental mais forte e atribuem esta obra a Lisboa em 1721. Em Lisboa existe uma cópia do Te Deum a oito vozes mais b.c., que imagino ser contemporânea do compositor, na Sé Patriarcal de Lisboa onde tive o prazer de a consultar.
Agradeço ainda a João Pedro d'Alvarenga que me recordou que a cópia de lisboa não era do Stabat Mater que confundi com o Te Deum. Acrescenta o musicólogo: "Subsistem seis cópias setecentistas, mas na Áustria, na Alemanha (duas), em Itália (duas) e nos EUA. Por outro lado, crê-se agora que este Stabat Mater possa ter sido escrito para a Patriarcal de Lisboa, possivelmente em 1721."

É uma obra complexa de sentimento, religiosidade e de técnica composicional. As vozes cruzam-se em múltiplas combinações. Os quatro sopranos, dois contraltos, dois tenores e dois baixos têm partes complexas que apenas coros muito bem preparados ou solistas de alto nível podem abordar. É um texto virtuosístico escrito de forma "antiga" mas utilizando todos os recursos conhecidos por Scarlatti que domina com habilidade polifonia e contraponto, recorrendo a dissonâncias para gerar desconforto e dor ou fazendo pausas súbitas para explorar as ressonâncias dos grandes espaços eclesiais onde se celebraria a liturgia criando efeitos de um dramatismo surpreendente.
Claudio Cavina recorreu a uma interpretação cheia de sentimento e religiosidade, lenta, quase solene, explorando até ao extremo a beleza sonora do conjunto instrumental: teorba, violone e orgão no baixo contínuo; e o conjunto vocal da Venexiana, agora a dez vozes, o dobro da formação usual.
Devo dizer que todos os cantores foram superlativos e estiveram em perfeita sintonia. Dez vozes em equilíbrio perfeito. Timbres muito belos nos sopranos, no segundo contralto, Cavina realizou o primeiro contralto também de forma superior, nos tenores e nos baixos. Um Stabat Mater perfeito. Pena a sala ser demasiado pequena para a força polifónica de um orgânico tão superlativo. Pena também a ausência de reverberação da sala.
Após o concerto Claudio Cavina quase nos garantiu que gravaria este Stabat Mater naquilo que será uma gravação antológica certamente.
Um dos melhores concertos da Festa da Música, quer pela interpretação, quer pela qualidade da música. N.A.: 20, N.T. 18.
Má nota para o programa que nos diz que Scarlatti tinha a paixão pelo jogo e que passou por dificuldades financeiras, boatos provavelmente falsos e dos quais não existe a menor documentação coeva.

Concerto 108. Pierre Hantaï cravo. Obras variadas de Bach.

O programa mais uma vez não correspondeu ao que Hantaï tocou. Sei que tocou o prelúdio e fuga BWV 902 anunciados e uma suite inglesa BWV 807 e mais qualquer coisa no início. O extra foi o início da partita nº6.
Hantaï começou irritado, desconcentrado, a fazer fita olhando com ar de mau para o público.
Passou o tempo todo a bater no cravo e no teclado como se estivesse em fúria. Conseguiu um excelente primeiro andamento da suite inglesa e um extra convincete.
Nunca criou magia, tentou improvisar, rechear a música de acordes e de ornamentações subtis e densas mas falhou sempre na técnica; a parte artística sofreu naturalmente com o dia não de Hantaï, acabaram por ser demasiadas notas erradas, notas esmagadas e passagens pouco limpas para se obter qualquer fruição estética, ao nível do banal.
Um recital fraco para Pierre Hantaï o que foi uma pena, uma vez que falhei o Dido e Eneias que tinha recomendado aqui e que tinha previsto inicialmente. N.T. 12, N.A. 13.

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