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9.1.06

Notícias 

Hoje decorreu o concerto de Reis na Igreja de Santa Maria de Belém. O Divino Sospiro e o coro de Santa Maria de Belém dirigidos por Enrico Onofri interpretaram o Gloria de Vivaldi e o Magnificat de Bach.

Estando ligado ao Divino Sospiro desde a sua fundação, posso hoje comentar com alguma distância uma vez que me desliguei de participar nos orgãos directivos. Por motivos que se prendem com a incompatibilidade da autoria de um programa de rádio com funções dirigentes numa Associação Cultural, não me sentiria à vontade para noticiar ou criticar uma organização onde participo, neste caso com trabalho voluntário mas em todo o caso com muita afectividade. Não terei ainda toda a distância, tal como Cavaco não pode esconder uma simpatia pelo PSD apesar de se apresentar como suprapartidário. De qualquer modo o meu sentido crítico nunca se deixou afectar por afectividades mas o que é certo é que me sinto mais liberto para poder exprimir opiniões neste assunto.

Gostei do concerto, admirei a prestação excelente do coro de Santa Maria de Belém, quer nas articulações e acentuações impressas por Onofri, quer pela técnica em Bach. O Magnificat é uma obra extremamente complexa para um coro profissional e um coro amador poderia estar em dificuldades numa obra deste calibre. Trata-se de uma peça a cinco partes e em que o contraponto e os cromatismos melismáticos numa escrita vocal quase solística são terríveis. Não se notou qualquer tergiversão ou distorção da partitura para facilitar a acção do coro. Tempos enérgicos, acentuações e ritmo vivo numa coordenação total entre orquestra, solistas (quase todos) coro e maestro foram evidentes. Penso que Enrico Onofri fez um trabalho notável com o coro de Santa Maria de Belém ou não seja o maestro italiano também dotado de dotes vocais elevados e capacidade de explicar o sentido do que pretende de forma altamente pedagógica. A clareza da sua gestualidade perante os cantores é também um exemplo para qualquer um que pretenda dirigir um concerto coral sinfónico, Onofri dirigiu o coro sem esquecer a orquestra mantendo um domínio total de todas as forças em presença.
A orquestra esteve bem, com particular destaque para as difíceis partes de trompete, notou-se um empenho tremendo das cordas, afinação muito cuidada, soli muito bem executados por Pedro Castro no Oboé e restantes instrumentistas, traversos, fagote, violinos e uma nota muito elevada para o órgão de Fernando Miguel Jalôto e violoncelos da Diana e do Filipe.
Infelizmente a acústica complexa dos Jerónimos não deixou perceber o detalhe e o trabalho de Onofri na filigrana contrapontística de Bach. Deu para ir percebendo a acentuação nos momentos e nas palavras de maior dramatismo. Joana Seara esteve brilhante no segundo soprano, grande projecção e voz de grande lirismo. Orlanda Isidro com timbre muito elegante e com uma colocação perfeita apresentou um fraseado de uma correcção ímpar. Um contratenor inacreditável incapaz de cantar e do qual nem me recordo o nome foi o pior deste concerto, entradas erradas, atraso nos tempos, frases inteiras a patinar sem se aproximar sequer da melodia correcta e longe mais de um tom de qualquer nota, sem saber cantar e de voz horrível esteve totalmente fora do conjunto, terá de haver sempre uma flor destas num bom bouquet? Marco Alves dos Santos tem uma voz bonita e cumpriu com muito brio e concentração a sua parte de tenor. Finalmente Rui Baeta esteve muito bem, muito jovem acabou por estar seguro e firme no seu papel de baixo, pujante e de voz bonita e bem modulada, afinado e bem timbrado, apenas lhe falta alguma projecção no registo mais grave, mas estamos em presença de um barítono e não se lhe pode exigir mais profundidade nos graves, foi aliás uma belíssima surpresa para mim poder escutar este cantor neste repertório.
Um concerto que mostra que Portugal pode apresentar uma orquestra barroca digna desse nome com trabalho e um bom director: Enrico Onofri é um portento de musicalidade, de energia e de trabalho. A sua comunicabilidade em ensaio e posteriormente em concerto a sua vitalidade e energia, quer como solista quer como director, fazem dos seus concertos autênticas explosões de música.

Jerónimos a abarrotar de gente, muito ruído de fundo e gente mal educada que não se sabe comportar em presença da música e muitas crianças de colo aos gritos ao longo de toda a interpretação dificultaram a escuta da música aborrecendo todos a começar pelos próprios petizes e pelos respectivos paizinhos que bem poderiam ter ido chatear o próximo para qualquer centro comercial em vez de virem tentar arruinar um concerto de música barroca, felizmente a única ruína musical acabou por ser um contratenor errado dentro de um conjunto muitos furos acima.

P.S. Uma nota final para reparar uma injustiça que cometi no texto anterior ao esquecer o maestro de coro de Santa Maria de Belém: Devo realçar o trabalho de Fernando Pinto à frente do trabalho vocal É de facto sua uma grande parcela do trabalho de base com o Coro. Sem o maestro de coro de Santa Maria de Belém nunca teria sido possível preparar as obras apresentadas. Um bom trabalho a merecer uma referência altamente elogiosa.


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