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27.1.06

Mozart 

Não posso dizer que Mozart seja o meu compositor preferido, nem sequer consigo ter um compositor preferido, mas Mozart nunca seria um candidato. Depois de perceber as maravilhas de Monteverdi ou de Schütz, depois de ter passado anos a ouvir a obra de Bach, depois de redescobrir um Handel destruído durante décadas por interpretações manhosas ao qual o Mozart não seria alheio, o Mozart que eu ouvia deliciado aos 10 anos, talvez nessa altura talvez tenha sido o meu compositor preferido, foi-se diluindo no seu génio fácil e perfeito num tempo próprio.
Quando hoje olho para uma partitura de Wagner, um Tristan ou uma Walküre ou um Götterdämmerung apercebo-me do génio relativo de Mozart, mas um génio maior apesar de tudo.

Depois há coisas que me irritam solenemente, uma delas é Salzburg, uma cidade relativamente horrível que vive à conta da negociata Mozart depois de ter tratado vergonhosamente Mozart em vida, mais o tal arcebispo que lá está enterrado na catedral com direito a retrato e que despediu Mozart com um pontapé no traseiro, para bem do próprio Mozart que era tratado como criado ao contrário de outros grandes senhores que deram outra consideração aos grandes compositores, apreendidos como grandes vultos do seu tempo (como Schütz). Viena padece do mesmo mal de Salzburg, em menor escala por ser uma cidade maior, com a tal casa do Mozart, onde nada existe de Mozart, para alimentar mais uma negociata, mas isso são irritações passageiras a par dos bombons horripilantes com a cara do Mozart, os fulanos que andam vestidos à Mozart, mas de ténis, a distribuir panfletos e a interminável lista de concertos de Mozart, geralmente em interpretações péssimas para turista enganar.
Enfim, faz hoje anos, 250 mais precisamente, o negócio Mozart continua em jornais e revistas, em rádios, sem os agentes se aperceberem disso. Um dia que fica e passa e amanhã será outro dia. Edições discográficas, vendas de discos e livros e mais negócio.
O pobre Mozart na sua vala comum continua a ser um compositor maltratado por interpretações escolares, por orquestras pouco vocacionadas para o estilo clássico, por instrumentos modernos que não dão o sabor verdadeiro da sua obra, por cantores que usam o vibrato de forma excessiva e berram como bodes, eles e elas, e usam e abusam de um estilo totalmente desajustado ao tempo e obra de Mozart. Mas isso fica para o resto do ano... a par do génio verdadeiro do compositor.


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