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21.7.05

O Público de Ópera - O Falhanço de Wagner 

Mazzucato in Boito na Segunda Edição do Grove: "Musica e ópera são palavras sinónimas, ninguém se preocupa senão com o que foi executado com sucesso no Scala. Bach, Beethoven, Mozart, Mendelssohn, Schumann, são tão desconhecidos como se não tivessem nascido. Tão tarde como em 1876, a única cópia das sinfonias de Beethoven que se podia encontrar estava na biblioteca do Conservatório [de Milão] era uma edição barata impressa em Mendrisio, e tão cheia de erros que em algumas partes era incompreensível."
Era evidente também que a ópera era uma forma totalmente ultrapassada de expressão artística, a ópera em números é um conceito ultrapassado, "e geralmente reconhecido por artistas sérios", diz Wagner em Ópera e Drama, " a ária é apenas uma evolução da canção folclórica e é apenas uma forma dos cantores se exibirem". Mas a revolução da ópera apenas se poderá fazer, explica Wagner, se o público mudar radicalmente. "O público de ópera apenas pretende divertir-se". Como diz Gerald Abraham no seu livro de 1938 (!) "Wagner numa das mais espantosas caminhadas da história da arte consegue criar uma obra de arte totalmente nova, unificada, consegue criar o teatro perfeito para a sua realização, consegue formar artistas para a sua execução, mas o público nunca conseguiu formar." Uma das mais extraordinárias caminhadas da história da arte desperdiçada num público hedonista (como Wagner tinha afirmado). É esta a filosofia do público de ópera de hoje. É evidente que não falo das senhoras que apenas mostram casacos de pele nas récitas ou dos senhores que vão à ópera porque parece bem e que acham Wagner muito longo e aborrecido. Escrevo mesmo sobre os que gostam de ópera genuinamente, e são considerados eruditos no assunto, e que sabem tudo sobre o soprano XX ou o Tenor YY. E que dão notícias de última hora: "sabes que fulana tal emagreceu 55 quilos e colocou uma banda gástrica". E o maestro tal que foi para a cama com o soprano ZZ ou com o baixo WW? Já sabias? E a fulana que não deu o dó em Paris porque está velha, e o Met aqui e acoli, e blá blá blá, num repositório ridículo de nulidades. "E o meu preferido no D. Giovanni é este ou aquele mas prefiro o Böhm na gravação quejanda", e têm fotografias de tenores ou de sopranos, e babam-se por uma récita que meta o ídolo a ou b... Enfim, gente para quem a música e a poesia, o drama e filosofia, o devir e o sofrimento nos argumentos apenas estimulam o apetite para mais um dó de peito ou umas sensações emotivas de identificação doentia com este ou aquele cantor em certas árias esperadas com ansiedade. Encenação confundida com cenário, marcações com roupas e jóias, e mesmo quando falam de música resumem tudo ao canto, a particularidades da voz e esquecem o discurso, a construção, o drama.
Discutimos hoje ainda duas opções: A Milão do século XIX ou os seis anos mágicos em que Wagner não compõe para repensar tudo (a partir de 1848)?
Será que o mundo não mudou nas pobres cabeças das chamadas classes "operáticas"?
Creio mesmo que não, infelizmente, Wagner falhou e muito, basta constatar em meia dúzia de sites de fãs de ópera, sobretudo altares de cantores, ou de blogues sobre o assunto. É evidente que se é livre para adorar ídolos, este texto apenas é uma reflexão sobre o assunto, deploro sem condenar expondo a minha perspectiva.

Este ano vou estar em Bayreuth, é uma espécie de peregrinação, mas que encaro com muito cepticismo. O chamado templo não deixa de ser igual a cada casa de ópera do mundo em termos de público, creio que os wagnerianos não serão muito diferentes do padrão universal. Embora se encontre gente muito interessante entre os wagnerianos convictos, a massa é a mesma. Wagner falhou redondamente na sua tentativa de criação de um novo público, pensante, abarcador, conhecedor, preparado para a obra de arte total.
Um novo Tristan e um Parsifal velho de um ano, Tannhäuser, Lohengrin e Holandês; o novo drama e a velha ópera. Creio que as ideias do Patriarca já não entram na cabeça dura de um neto de Wagner (Wolfgang) demasiado conservador, demasiado enquistado, demasiado medíocre, demasiado pró nazi (sei que dizer isto não é politicamente correcto) para ter percebido o que o avô queria dizer; ao contrário do irmão, Wieland, falecido prematuramente nos anos sessenta que sendo nazi era ao mesmo tempo um génio. Mas continua a ser o templo e temos de nos preparar, respeitando o que Wagner dizia. Partituras prontas, livros em dia, Bayreuth segue dentro de poucos dias. Com Debussy e Vianna da Motta, não sei porquê recordo sobretudo as peregrinações destes últimos a Bayreuth, faço as malas e tento não pensar no falhanço de Wagner relativamente ao público.
Escuto algumas gravações, sem olhar a nomes de cantores, pensando nas concepções globais, nos maestros, nas orquestras, nos discursos dramáticos e preparo-me. Leio velhos livros e vou pensando neste mundo...



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