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20.6.05

Mahler no CCB - Uma não crítica 


Infelizmente a versão adoptada por Eliahu Inbal foi a segunda versão da impressionante sexta de Mahler. O terceiro e aniquilante golpe, antes do funeral anunciado pelos trombones, ficou assim na imaginação que quem escutou a obra ontem no CCB. Curiosamente se Inbal seguiu a prática de Mahler neste aspecto (que retirou a terceira pancada da partitura por recear que esta representasse a sua própria morte ou a sua própria derrota perante a vida), esqueceu (e no meu entender bem) essa mesma prática mahleriana de executar o andante na segunda posição e o scherzo na terceira adoptando a ordem da recente edição crítica. Noto ainda que o andante é um dos mais belos momentos da história da música. Cada nota é uma sílaba intensa contida no verso de cada frase, cada verso encaixa num imenso puzzle de um poema eterno, etéreo, mágico e sublime, e estas palavras são meros esboços, esgares de nada perante a verdadeira força evocativa da música de Mahler onde as palavras perdem a força perante os sons. Convido, aliás, todos os leitores a esquerem estas palavras e escutarem o andante desta sinfonia, urgentemente, que andar a ler blogues é uma perda de tempo com tanta música bela para escutar...

Como prometi não fazer crítica a agrupamentos portugueses, apenas comento o maestro e a questão técnica do instrumento utilizado para as pancadas secas do último andamento, "que devem ser muito intensas e não metálicas". Foi utilizado um monstruoso maço de madeira que percute uma ridícula, patética, caixinha de madeira. Tanto maço para tão pequena caixa! Claro que a minúscula caixinha, quase invisível se reflectiu na sonoridade vergonhosa, quase inaudível, que não se ouviu na sala. Será que é muito caro mandar fazer um instrumento que consiga dar a sensação de um tremendo estrondo, de uma espécie de trovão fulminante que esmague a música e dê ao público a sensação de uma pancada mortal, funesta, trágica? Pobre percussionista que tem de praticar haterofilia para levantar um martelo monstruoso para tão ridículo resultado, qualquer bombo de feira teria mais som...

Inbal pareceu-me ter uma direcção demasiado calma que não conseguiu imprimir a tensão sufocante e trágica que a sinfonia exige. Bastou ver a forma como as cordas graves entraram na sinfonia para perceber o que faltou. Esperava muito mais do maestro.

Serve ainda este post, e sem qualquer relação com o concerto comentado acima, para lamentar a falta de crítica que temos na imprensa portuguesa. É tudo bom, mediano, razoável, não há nada que seja mau. Consequência: o público aplaude de pé toda a porcaria que se apresenta, grita bravo a todo o músico que se contorça e a todo o cantor que se esmifre a berrar e não há qualquer relativização do que se escuta. Então quando se fala de intérpretes portugueses parece que reina a ditadura do medo e da maioria silenciosa. Existe uma verdadeira autocensura da crítica oficial, no fundo a pior censura. Sem uma crítica de serviço público, severa, atenta, responsável, a qualidade será muito mais difícil de atingir.

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