27.1.05
Temirkanov no Coliseu
Graças à Fundação Gulbenkian tivemos três concertos de altíssimo nível em três dias.
Escrevo em primeiro lugar do concerto de Domingo no Coliseu pela Orquestra Filarmónica de São Petersburgo com direcção de Yuri Temirkanov e com Elisso Virsaladze ao piano. Em boa hora se substituiu o inicialmente previsto Sergei Rachmaninov do enjoativo Vocalise, op.34, que abria o programa, pela abertura de Carl Maria von Weber: Euryanthe. O belíssimo concerto de Robert Schumann, em Lá menor, op.54, fechava a primeira parte e na segunda parte A Sagração da Primavera do maior compositor russo: Igor Stravinsky.
A abertura de Weber, com as cordas na máxima força, 15 primeiros violinos, 14 segundos, 12 violetas, 10 violoncelos, 9 contrabaixos, teve a intensidade pré-romântica de Weber no ponto certo (uma orquestra demasiado vasta por padrões musicológicos, mas certa numa sala como Coliseu). Sopros muito elegantes e com uma personalidade vincada deram cor à paleta deste grande compositor alemão. Uma direcção, sem batuta, de Temirkanov, seguríssima, elegante, enfática sem exageros gestuais, sublinhando o essencial, conduzindo com a autoridade do domínio total da obra a orquestra. Bonito de se ver e de se ouvir.
Como já foi apontado por alguma crítica em jornais de grande circulação, o concerto de Schumann foi prejudicado por dois factores: falta de densidade das cordas, reduzidas a 4 contrabaixos, seis violoncelos, oito violetas, dez segundos violinos e 12 primeiros, o que na péssima acústica do Coliseu acabou por prejudicar a audição do concerto. Por outro lado existiram desacertos entre orquestra e piano. Neste concerto o piano foi o motor da orquestra, uma suavidade de ataque sem par, um ritmo avassalador, um Schumann íntimo sem cair no sentimentalismo exagerado, fizeram do concerto de Schumann um momento de grande intensidade. A professora de Filipe Pinto Ribeiro, que além de grande pianista é uma excelente professora, mostrou como se aborda um concerto desta envergadura: contenção total em termos sonoros, economia de meios e ao mesmo tempo uma energia poderosíssima.
Com respeito a Stravinsky as palavras faltam, como já apontámos anteriormente. A obra foi abordada pelo seu lado selvático, pela sua força vital, pelas raízes da terra. A obra estrutura-se como um puzzle sinfónico em que os naipes encaixam. Percebeu-se que teríamos uma interpretação histórica ao escutar o solo do fagote que inicia a obra. A naturalidade, a descontracção, aparente, do primeiro fagote, homem com mais de setenta anos, ao abordar o solo da responsabilidade e carga deste momento introdutório impressionou. A partir daqui tudo foi possível, um primeiro trompete, que parecia um urso siberiano, mas que tocava como um mágico deixou memória. A precisão absoluta da percussão. A densidade das cordas, a força dos contrabaixos, o domínio do ritmo de toda a orquestra. As intervenções solísticas de clarinetes sopranos, agudos e baixos, dos oboés, e das flautas foram de arrepiar. A extraordinária qualidade das trompas, dos trombones, dos trompetes e das tubas. Tudo sob a calmíssima supervisão do maestro, que de forma discreta acentuava o que se devia acentuar e conduzia o conjunto para a morte sacrificial que conclui a obra. Quase sem falhas, apenas na entrada da cena do sacrifício um desacerto entre cordas e sopros até deu sal à interpretação.
Temirkanov ensinou como se deve dirigir e trabalhar uma orquestra sinfónica de virtuosos.
Se pensamos no que ganham estes músicos e na forma como tocam, no empenho e profissionalismo, no estudo que está por detrás. Se pensarmos no som que produzem e nas condições que têm só podemos lamentar aqueles que se queixam de tudo e nada, daqueles que não têm orgulho na arte a que se dedicaram e vendem fraude em vez de darem sonho.
Um paradigma foi estabelecido neste domingo à noite. Fica o registo.
Uma palavra para o Coliseu: é uma sala miserável, ouvem-se barulhos parasitas de todos os lados, os músicos não têm as menores condições, a acústica é horrenda, as tosses propagam-se de forma mais intensa que os sons propagados a partir do palco! Uma sala sem as menores condições para servir de auditório para concertos sinfónicos.
Escrevo em primeiro lugar do concerto de Domingo no Coliseu pela Orquestra Filarmónica de São Petersburgo com direcção de Yuri Temirkanov e com Elisso Virsaladze ao piano. Em boa hora se substituiu o inicialmente previsto Sergei Rachmaninov do enjoativo Vocalise, op.34, que abria o programa, pela abertura de Carl Maria von Weber: Euryanthe. O belíssimo concerto de Robert Schumann, em Lá menor, op.54, fechava a primeira parte e na segunda parte A Sagração da Primavera do maior compositor russo: Igor Stravinsky.
A abertura de Weber, com as cordas na máxima força, 15 primeiros violinos, 14 segundos, 12 violetas, 10 violoncelos, 9 contrabaixos, teve a intensidade pré-romântica de Weber no ponto certo (uma orquestra demasiado vasta por padrões musicológicos, mas certa numa sala como Coliseu). Sopros muito elegantes e com uma personalidade vincada deram cor à paleta deste grande compositor alemão. Uma direcção, sem batuta, de Temirkanov, seguríssima, elegante, enfática sem exageros gestuais, sublinhando o essencial, conduzindo com a autoridade do domínio total da obra a orquestra. Bonito de se ver e de se ouvir.
Como já foi apontado por alguma crítica em jornais de grande circulação, o concerto de Schumann foi prejudicado por dois factores: falta de densidade das cordas, reduzidas a 4 contrabaixos, seis violoncelos, oito violetas, dez segundos violinos e 12 primeiros, o que na péssima acústica do Coliseu acabou por prejudicar a audição do concerto. Por outro lado existiram desacertos entre orquestra e piano. Neste concerto o piano foi o motor da orquestra, uma suavidade de ataque sem par, um ritmo avassalador, um Schumann íntimo sem cair no sentimentalismo exagerado, fizeram do concerto de Schumann um momento de grande intensidade. A professora de Filipe Pinto Ribeiro, que além de grande pianista é uma excelente professora, mostrou como se aborda um concerto desta envergadura: contenção total em termos sonoros, economia de meios e ao mesmo tempo uma energia poderosíssima.
Com respeito a Stravinsky as palavras faltam, como já apontámos anteriormente. A obra foi abordada pelo seu lado selvático, pela sua força vital, pelas raízes da terra. A obra estrutura-se como um puzzle sinfónico em que os naipes encaixam. Percebeu-se que teríamos uma interpretação histórica ao escutar o solo do fagote que inicia a obra. A naturalidade, a descontracção, aparente, do primeiro fagote, homem com mais de setenta anos, ao abordar o solo da responsabilidade e carga deste momento introdutório impressionou. A partir daqui tudo foi possível, um primeiro trompete, que parecia um urso siberiano, mas que tocava como um mágico deixou memória. A precisão absoluta da percussão. A densidade das cordas, a força dos contrabaixos, o domínio do ritmo de toda a orquestra. As intervenções solísticas de clarinetes sopranos, agudos e baixos, dos oboés, e das flautas foram de arrepiar. A extraordinária qualidade das trompas, dos trombones, dos trompetes e das tubas. Tudo sob a calmíssima supervisão do maestro, que de forma discreta acentuava o que se devia acentuar e conduzia o conjunto para a morte sacrificial que conclui a obra. Quase sem falhas, apenas na entrada da cena do sacrifício um desacerto entre cordas e sopros até deu sal à interpretação.
Temirkanov ensinou como se deve dirigir e trabalhar uma orquestra sinfónica de virtuosos.
Se pensamos no que ganham estes músicos e na forma como tocam, no empenho e profissionalismo, no estudo que está por detrás. Se pensarmos no som que produzem e nas condições que têm só podemos lamentar aqueles que se queixam de tudo e nada, daqueles que não têm orgulho na arte a que se dedicaram e vendem fraude em vez de darem sonho.
Um paradigma foi estabelecido neste domingo à noite. Fica o registo.
Uma palavra para o Coliseu: é uma sala miserável, ouvem-se barulhos parasitas de todos os lados, os músicos não têm as menores condições, a acústica é horrenda, as tosses propagam-se de forma mais intensa que os sons propagados a partir do palco! Uma sala sem as menores condições para servir de auditório para concertos sinfónicos.
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