23.12.04
Um email
Fui com alguns amigos a um concerto no Coliseu a 3 de Dezembro de 2004, cantavam Elisabete Matos e José Fardilha, dirigia Giuliano Carella. Um programa aliciante com Mozart e Verdi. Orquestra do Norte. Vejamos a impressão que causou o concerto a um dos meus amigos, num email que escreveu à filha a estudar actualmente no estrangeiro e que gentilmente concordou em publicar aqui neste blog:
Lisboa, 4 de Dezembro de 2004
Querida I.:
Ontem fui assistir a um concerto no Coliseu: Elizabete Matos e José Fardilha. Na primeira parte música de ópera de Mozart – Bodas, Tito, Don Giovanni (o catálogo) – e na segunda de Verdi – a ... extraviada, o Ernani ( como o Pinto Basto) o Trovador (Udiste? e por aí fora) e o Macbeth (ópera que adoro) .
Toda a gente tinha a sensação de estar numa sala do século XIX talvez em Itália ou na Roménia ou mesmo em Portugal, mas a viver um filme do Fellini: a sala estava montada para os espectáculos de circo do Natal e no meio desse cenário – a que não faltava uma moto pendurada num balcão, mais os trapézios – estava a orquestra. No público, o Álvaro Cassutto ajudava a compor o quadro surrealista – eu sei que para ti ele é o Álvaro Casusto!!! Mas eu, apesar de tudo, acho que a gente não pode desprezar o pouco que tem.
Mas a música? A música?? A música era também tocada no estilo da popular música das pequenas filarmónicas italianas (do tempo do Verdi). A orquestra era a Orquestra do Norte. Quando me lembro dos concertos que ouvi tocados por orquestras locais de pequeníssimas cidades da Roménia só penso na diferença entre uma mula que apesar de tudo é útil, quando não há melhor, e um cavalo árabe.
Se tivesses assistido tinhas ficado doente e traumatizada por muito tempo com o ar circense do concerto, a que não faltou o público a aplaudir fora de prazo (eu próprio, como que para me sentir ambientado, o fiz antes da Violetta morrer no dueto final da Traviatta; a verdade é que esse duetto não foi mal cantado).
Enfim o que destoava desse ambiente descontraído decimonónico era (imagine-se!!!) um estupor (ou antes uns estupores) de uns microfones (que eu não consegui ver onde estava colocados) que algum arrumador da sala mais imaginativo deve ter decidido pôr a funcionar para amplificar as vozes dos cantores. O Fardilha chegava a ouvir-se de quatro lugares diferentes em grandes quase-uníssonos. Incrível. Sobretudo porque a Elizabete Matos até cantou bem o Verdi (e pessimamente o Mozart) e o Fardilha até cantou bem o Mozart (e pessimamente o Verdi). Quer dizer: do ponto de vista das vozes eu diria que até houve meio-concerto, graças à distribuição que acabo de referir.
O que mais me doeu foi ver a sala do Coliseu (pobrezinha mas compostinha) cheia de borlistas (eu por exemplo) a aplaudir nacionalísticamente dois "grandes artistas portugueses" num espectáculo efectivamente raro, quando afinal se trata de dois artistas a meu ver honestos, sim, e certamente com qualidade mas que devem fazer recitais e espectáculos nos países onde estão – felizmente – a viver, coisas de muito melhor qualidade e sem dúvida em grande quantidade. Mesmo para eles tratou-se de uma recitazinha e sem dúvida que prefeririam, isso sim, integrar uma companhia de ópera que de vez em quando cantasse no S.Carlos.
Em resumo: o espectáculo – realmente entre o circo e a ópera – foi para mim uma tragédia.
Beijinhos do Papá
Paulo
Lisboa, 4 de Dezembro de 2004
Querida I.:
Ontem fui assistir a um concerto no Coliseu: Elizabete Matos e José Fardilha. Na primeira parte música de ópera de Mozart – Bodas, Tito, Don Giovanni (o catálogo) – e na segunda de Verdi – a ... extraviada, o Ernani ( como o Pinto Basto) o Trovador (Udiste? e por aí fora) e o Macbeth (ópera que adoro) .
Toda a gente tinha a sensação de estar numa sala do século XIX talvez em Itália ou na Roménia ou mesmo em Portugal, mas a viver um filme do Fellini: a sala estava montada para os espectáculos de circo do Natal e no meio desse cenário – a que não faltava uma moto pendurada num balcão, mais os trapézios – estava a orquestra. No público, o Álvaro Cassutto ajudava a compor o quadro surrealista – eu sei que para ti ele é o Álvaro Casusto!!! Mas eu, apesar de tudo, acho que a gente não pode desprezar o pouco que tem.
Mas a música? A música?? A música era também tocada no estilo da popular música das pequenas filarmónicas italianas (do tempo do Verdi). A orquestra era a Orquestra do Norte. Quando me lembro dos concertos que ouvi tocados por orquestras locais de pequeníssimas cidades da Roménia só penso na diferença entre uma mula que apesar de tudo é útil, quando não há melhor, e um cavalo árabe.
Se tivesses assistido tinhas ficado doente e traumatizada por muito tempo com o ar circense do concerto, a que não faltou o público a aplaudir fora de prazo (eu próprio, como que para me sentir ambientado, o fiz antes da Violetta morrer no dueto final da Traviatta; a verdade é que esse duetto não foi mal cantado).
Enfim o que destoava desse ambiente descontraído decimonónico era (imagine-se!!!) um estupor (ou antes uns estupores) de uns microfones (que eu não consegui ver onde estava colocados) que algum arrumador da sala mais imaginativo deve ter decidido pôr a funcionar para amplificar as vozes dos cantores. O Fardilha chegava a ouvir-se de quatro lugares diferentes em grandes quase-uníssonos. Incrível. Sobretudo porque a Elizabete Matos até cantou bem o Verdi (e pessimamente o Mozart) e o Fardilha até cantou bem o Mozart (e pessimamente o Verdi). Quer dizer: do ponto de vista das vozes eu diria que até houve meio-concerto, graças à distribuição que acabo de referir.
O que mais me doeu foi ver a sala do Coliseu (pobrezinha mas compostinha) cheia de borlistas (eu por exemplo) a aplaudir nacionalísticamente dois "grandes artistas portugueses" num espectáculo efectivamente raro, quando afinal se trata de dois artistas a meu ver honestos, sim, e certamente com qualidade mas que devem fazer recitais e espectáculos nos países onde estão – felizmente – a viver, coisas de muito melhor qualidade e sem dúvida em grande quantidade. Mesmo para eles tratou-se de uma recitazinha e sem dúvida que prefeririam, isso sim, integrar uma companhia de ópera que de vez em quando cantasse no S.Carlos.
Em resumo: o espectáculo – realmente entre o circo e a ópera – foi para mim uma tragédia.
Beijinhos do Papá
Paulo
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