5.9.04
O Regresso
Em Lisboa, depois destes dias de Alpes, Áustria e Itália. Depois de alguma música.
Escrevo tocado com algo que vi ontem. Saí cedo da cidade onde fiquei, perto da fronteira entre a Itália e a Áustria para apanhar o meu voo em Bologna. Pensei passar por Pádua (Padova), perto de Veneza, porque tinha todo o dia para apanhar o avião da Portugália às 18h45m e apenas 250 quilómetros para percorrer. O caminho pela autoestrada de Brenner é terrível, milhares e milhares de loucos italianos a acelerar quer em carros mínimos quer em bólides potentíssimos, "tedescos" de idade mais ou menos avançada (os mais idosos tiram férias em Setembro porque já não têm as crianças e o clima na Itália é melhor) nos seus carros "tedescos" a velocidades baixíssimas na faixa da esquerda tudo mesclado com camiões às centenas. Assim vou pela SS47 directo a Pádua ver o Santo António de Lisboa que morreu nessa cidade, evito também a A1 de Milão para Roma a mais infernal auto-estrada da Europa ocidental. A estrada para Pádua tem muito pouco movimento e dá-me a certeza de chegar a tempo sem uma "coda" de 150 km, como presenciei uma vez na autoestrada de Brenner. Depois um pouco de recolhimento, de meditação, de paz, só me fariam bem e Bologna já fica perto. Os dias terríveis da Ossétia, o fogo na biblioteca de Weimar tinham-me deixado algo abalado e triste.
Tomo o meu capuccino com croissants numa esplanada de Trento manhã bem cedo, segue-se um breve almoço, muito antecipado, em casa de amigos e arranco para Padova pelo meio dia.
Chegada a Pádua pelas 13h45m depois de cento e vinte quilómetros de uma calma e boa estrada quase sempre em via rápida e sem carros nenhuns. Estaciono junto do centro perto do Jardim botânico e a cinco minutos a pé do Santo.
A surpresa chega com a Basílica, gerida por franciscanos, tudo é gratuito, museu, vida do santo, relíquias... Relíquias? Sim, o Santo António foi esquartejado, o túmulo situado no templo deve conter apenas ar ou um pedaço de uma tíbia para não dizer que foi tudo saqueado, o Queixo do Santo, Dedos do Santo, Língua do Santo, Aparelho Fonético do Santo, tudo embalado em recipientes de vidro, com muito ouro à volta e exibido festivamente pelos franciscanos. Noutras igrejas outros pedaços do nosso Fernando são alegremente mostrados para gáudio do povo e da sua crendice, com o beneplácito da Igreja Católica. Depois milhares de ex-votos são exibidos junto do túmulo, existem uns papelotes na entrada do Templo onde se escrevem pedidos para o Santo que depois são introduzidos debaixo do túmulo por uma fenda própria... Um casino diria eu, o sentido italiano do termo: uma confusão; mas ao mesmo tempo a palavra com o seu sentido em português. Nenhum recolhimento, barulho, crendice superstição, tudo sob o olhar benevolente dos franciscanos, pelos quais nutro aliás uma grande simpatia. Mas tudo feito sem decoro, o ouro, a riqueza, a superstição. O máximo é atingido quando vejo um monge idoso de barba branca a dar a sua benção cronometrada com a mão bem assente na cabeça de cada crente ajoelhado depois de estar numa bicha de duas horas.
Saí e dei um salto à basílica de S. Giustina, um dos mais belos e luminosos edifícios da Itália do Norte e cuja origem tem 1600 anos existindo ainda uma capela da altura da fundação, sendo a reconstrução do século XII. Um enorme edifício silencioso. Falei com um velho beneditino com mais de oitenta anos, sequíssimo de carnes e de olhos azuis tremendamente penetrantes, hábito preto. O fratelo perguntou-me de onde eu era. Eu respondi que vinha de Lisboa ao que ele me disse: É verdade! Tu já tens o Santo, é o vosso Santo, mas aqui podes estar à vontade, esta é a tua casa...
Escrevo tocado com algo que vi ontem. Saí cedo da cidade onde fiquei, perto da fronteira entre a Itália e a Áustria para apanhar o meu voo em Bologna. Pensei passar por Pádua (Padova), perto de Veneza, porque tinha todo o dia para apanhar o avião da Portugália às 18h45m e apenas 250 quilómetros para percorrer. O caminho pela autoestrada de Brenner é terrível, milhares e milhares de loucos italianos a acelerar quer em carros mínimos quer em bólides potentíssimos, "tedescos" de idade mais ou menos avançada (os mais idosos tiram férias em Setembro porque já não têm as crianças e o clima na Itália é melhor) nos seus carros "tedescos" a velocidades baixíssimas na faixa da esquerda tudo mesclado com camiões às centenas. Assim vou pela SS47 directo a Pádua ver o Santo António de Lisboa que morreu nessa cidade, evito também a A1 de Milão para Roma a mais infernal auto-estrada da Europa ocidental. A estrada para Pádua tem muito pouco movimento e dá-me a certeza de chegar a tempo sem uma "coda" de 150 km, como presenciei uma vez na autoestrada de Brenner. Depois um pouco de recolhimento, de meditação, de paz, só me fariam bem e Bologna já fica perto. Os dias terríveis da Ossétia, o fogo na biblioteca de Weimar tinham-me deixado algo abalado e triste.
Tomo o meu capuccino com croissants numa esplanada de Trento manhã bem cedo, segue-se um breve almoço, muito antecipado, em casa de amigos e arranco para Padova pelo meio dia.
Chegada a Pádua pelas 13h45m depois de cento e vinte quilómetros de uma calma e boa estrada quase sempre em via rápida e sem carros nenhuns. Estaciono junto do centro perto do Jardim botânico e a cinco minutos a pé do Santo.
A surpresa chega com a Basílica, gerida por franciscanos, tudo é gratuito, museu, vida do santo, relíquias... Relíquias? Sim, o Santo António foi esquartejado, o túmulo situado no templo deve conter apenas ar ou um pedaço de uma tíbia para não dizer que foi tudo saqueado, o Queixo do Santo, Dedos do Santo, Língua do Santo, Aparelho Fonético do Santo, tudo embalado em recipientes de vidro, com muito ouro à volta e exibido festivamente pelos franciscanos. Noutras igrejas outros pedaços do nosso Fernando são alegremente mostrados para gáudio do povo e da sua crendice, com o beneplácito da Igreja Católica. Depois milhares de ex-votos são exibidos junto do túmulo, existem uns papelotes na entrada do Templo onde se escrevem pedidos para o Santo que depois são introduzidos debaixo do túmulo por uma fenda própria... Um casino diria eu, o sentido italiano do termo: uma confusão; mas ao mesmo tempo a palavra com o seu sentido em português. Nenhum recolhimento, barulho, crendice superstição, tudo sob o olhar benevolente dos franciscanos, pelos quais nutro aliás uma grande simpatia. Mas tudo feito sem decoro, o ouro, a riqueza, a superstição. O máximo é atingido quando vejo um monge idoso de barba branca a dar a sua benção cronometrada com a mão bem assente na cabeça de cada crente ajoelhado depois de estar numa bicha de duas horas.
Saí e dei um salto à basílica de S. Giustina, um dos mais belos e luminosos edifícios da Itália do Norte e cuja origem tem 1600 anos existindo ainda uma capela da altura da fundação, sendo a reconstrução do século XII. Um enorme edifício silencioso. Falei com um velho beneditino com mais de oitenta anos, sequíssimo de carnes e de olhos azuis tremendamente penetrantes, hábito preto. O fratelo perguntou-me de onde eu era. Eu respondi que vinha de Lisboa ao que ele me disse: É verdade! Tu já tens o Santo, é o vosso Santo, mas aqui podes estar à vontade, esta é a tua casa...
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