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18.8.04

Uma voz por parte III 

Arcebispo de Mainz, Arcebispo de Trier, Arcebispo de Colónia, o Rei da Boémia, o Conde Palatino do Reno, o Conde Palatino e Duque da Saxónia e o Margrave de Brandenburgo aos quais se juntaram mais tarde o Duque da Baviera (Eleitor da Baviera) e o Duque de Brunswick-Lüneburg (Eleitor de Hanover) tinham o papel de eleger o Imperador, geralmente um Habsburg apenas confirmado pelos restantes. Eram os eleitores do Império Romano, título que perdurou até à sua abolição por Napoleão em 1806.


Mapa da Alemanha em 1788

A Saxónia onde Bach viveu a partir de 1723 tinha capital em Dresden. As cortes alemãs desprezavam a língua local e tentavam arranhar o francês, Bach não escapa a esse hábito, "à la mode" ou melhor dizendo alamodische Zeit, segundo a moda do tempo. Escreve muitas vezes usando palavras francesas nas suas partituras. O "bom dia" passa a dizer-se grosseiramente "Wunschur"!

Eisenach, onde Bach nasceu, situa-se na Turíngia tinha 6000 habitantes, é o coração da Alemanha mais profunda. Florestas e castelos. O seu prestígio derivava do castelo de Wartburg, mais tarde celebrado por Wagner, que se situa nos montes acima de Eisenach. Wartburg que abrigou Lutero nos primeiros dias da Reforma. Uma aldeia pelos padrões de hoje.

O Castelo de Wartburg

Hamburgo tem então pouco mais de sessenta mil habitantes, a cidade hanseática era uma urbe enorme para o padrão da Alemanha despovoada pela sucessão de gerras trágicas que a consumiram no século XVII, com a guerra dos trinta anos à cabeça. Lübeck de Buxtehude tem apenas 30000, antiga capital da Liga está em franco declínio.

Arnstadt onde Bach inicia a sua carreira é uma cidade minúscula com 4000 habitantes, mesmo assim tantos quantos a ilha das Flores hoje. Vinte músicos e um pequeno teatro, um orgão com poucos registos. Uma pequena orquestra, mesmo assim mais do que maioria dos ensembles barrocos de hoje, mesmo os mais avantajados. Música para gáudio do seu príncipe e dos habitantes pagos com os impostos locais e os dinheiros das rendas do príncipe. Concertos públicos pagos ainda vão demorar muitos anos a aparecer.


Mühlhausen, 7000 almas, duas igrejas, muralhas imponentes, cidade governada pelo conselho municipal. Coro polifónico de boa qualidade, primeiras cantatas de Bach com coro! Polémicas constantes entre os dois pastores das duas igrejas, um pietista outro luterano ortodoxo... Bach usa sobretudo a Blasiuskirche com boa acústica, bom orgão e grande tradição vocal.


Bach casa-se nesses tempos felizes de Mühlhausen com a sua prima Maria Barbara na igreja de Dornheim.


Primeiras cantatas com coro? Pergunta o leitor e eu também. Sim, a cantatas BWV 4 poderá ter origem nesta cidade. Duas igrejas, um coro com mais de vinte cantores, uma cantata com extensas partes corais, complexas, contraponto muito elaborado, solistas caros seria impossível numa cidade como esta. Mesmo dividindo o coro pelas duas igrejas temos mais de uma voz por parte. Bach não compõe cantatas apenas em Leipzig, como os adeptos de "uma voz por parte" advogam implicitamente. Bach dispõe de coros antes de Leipzig e escreveu mais de trinta cantatas antes dos seus 38 anos.
Como então executar estas cantatas com base em pressupostos que se verificariam em Leipzig onde supostamente os recursos seriam menores? As sociedades corais eram frequentes. Cem anos antes de Bach, Schütz torna-se conhecido porque tinha uma voz de ouro quando era pequenino e cantava no coro do seu pai em Weissenfels, bem perto das terras de Bach. Porquê então a hipótese de que os extensos, complexos, elaborados, contrapontísticos coros das primeiras cantatas de Bach teriam de ser cantadas com um cantor por parte, quando isso seria muito mais difícil do que ensaiar um coro bem apoiado?
Com uma voz por parte seria quase uma calamidade se um dos cantores de que Bach dispunha se perdesse ou falhasse uma entrada sem o apoio dos colegas do coro.
Nem sequer a parte do soprano nesta cantata está dobrada por nenhum instrumento no cantus firmus composto originalmente por Lutero e usado por Bach na obra. Seria preciso um rapaz com uma segurança enorme para conseguir cantar a longa parte da melodia, bem sustentada sem o apoio de instrumentos a dobrá-lo, isto mesmo considerando que a melodia coral escrita por Lutero era bem conhecida. Além disso qual a razão de prescindir da força de um coro polifónico no louvor de Deus e das suas obras? Porque razão usar apenas o recurso anémico a solistas amadores e muito jovens? Recorde-se que as mulheres nunca cantavam nos coros das igrejas.
Claro que não acredito na teoria de "uma voz por parte" nestas cantatas iniciais.

Nesta cidade Bach publica a sua única cantata a ser publicada em vida "Gott ist mein König, BWV 71". Repare-se no uso da palavra "Motteto" e não "cantata" no frontispício da partitura.

Mais obras de Bach, entre outras algumas perdidas, neste período:

Tocata e Fuga em ré menor, BWV 565.
Prelúdio e Fuga em ré maior, BWV 532.
Passacaglia em dó menor, BWV 582.
Cantatas: Aus der Tiefen, BWV 131 (1707?)
Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit, Actus Tragicus, BWV 106.

Continua com Weimar...

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