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10.8.04

Jaquinzinhos e o défice 

Peço a Jaquinzinhos que refaça as contas das tabelas apresentadas com o crescimento de 3.5% para uma taxa de inflação de 2%. Ou 3% para uma inflacção de 1.5%. (Já o fiz e apresento uma tabela em que mostro que os impostos podem descer se a despesa pública crescer menos que a soma da inflação com o crescimento).

Eu não acredito que a despesa do Estado tenha de crescer, em valores actuais, de forma igual ao crescimento real do país. Essa é uma crença profunda, no futuro do meu país, taxar os cidadãos de um país a mais de cinquenta por cento da sua riqueza produzida é um abuso do Estado. Esse abuso terá de ser corrigido com o crescimento económico e com a redução do OE face ao PIB.

Acredito que a despesa do Estado suba de acordo com a inflacção mas descendo o seu peso sobre o PIB, o que Jaquinzinhos apresenta na sua última tabela, aquilo em que ele não acredita que seja possível..

Acrescento ainda um argumento de peso, como grande parte do Orçamento de Estado português é serviço de dívida, com a redução dos défices para valores inferiores ao crescimento estão-se a pagar aos bancos dívidas contraídas anteriormente e a desonerar os orçamentos seguintes reduzindo enormemente a despesa futura. Factor que JCD despreza totalmente nas suas contas e que constitui o seu maior erro. Peço desculoa pela expressão "erro" mas parece-me que as tabelas não incluindo esses serviços de dívida acabam por não corresponder a qualquer modelo exacto do fenómeno.

Ver a tabela

Crescimento de 3,25% nas despesas públicas anuais. Inflacção do país 2%. Despesa do Estado a crescer mais que a inflação. Crescimento global, com inflação, 3,5%. Assume-se que existe dívida pública anterior, muito baixa, de 0,5 do PIB e que é paga no ano zero. É incorporada na despesa global do Estado, todos os anos, a dívida do ano anterior. Juros de 6 por cento pagos à banca. Valores realistas.
Podem-se reduzir as cargas fiscais no longo prazo, com défice. Atenção que os impostos só crescem se a despesa crescer estritamente mais que o efeito somado da inflação e do crescimento da economia.

E se o Jaquinzinhos quiser terei todo o prazer numa almoçarada para se falar de outros assuntos, de preferência com alguns outros bloguistas de Agosto. Fica o convite. E fica prometido que deixo de tratar o Jaquinzinhos por pequeno-burguês suburbano neste blogue.

P.S. Acrescentado posteriormente. Já li a nova tentativa de JCD de tentar provar que défice implica impostos a subir no post. Existem duas formas de lidar com a dívida pública, a) assumir essa dívida sem orçamentar a sua amortização em anos posteriores. b) Orçamentar o serviço e amortizações da dívida em orçamentos seguintes, o que levará a défices maiores nos anos seguintes.

Um dilema. Felizmente o pacto de estabilidade fixa limites a ambos os valores, 2% para o défice e 60% (ambos sobre o PIB) para a dívida pública. O cobertor sendo curto só tapa um dos lados. Portugal está demasiado perto do limite em ambos os casos.

Na hipótese a) cada défice do ano entraria num poço sem fundo e tentar-se-ia pagar a dívida com o resultado de receitas não orçamentadas ou com o recurso a novas emissões obrigacionistas ou ainda, como tem sido feito pelos nossos governos, privatizando empresas e destinando 40% das receitas dessas privatizações (valor consagrado na Lei) para amortizar a dívida pública.
Parece uma catástrofe financeira em cascata manter uma dívida pública elevada, e é mesmo.
Em Portugal a dívida pública tem sido mantida abaixo dos 60% do PIB, pouco abaixo diga-se, devido a privatizações sucessivas e vendas de bens cujos resultados também entram no OE (60% do valor apurado) para tentar salvar a situação do défice. Mais uma vez o que salva um pouco a situação global é o crescimento económico que, fazendo subir o PIB, faz subir o tecto absoluto da dívida.
Creio que o governo PS tentou o expediente de passar parte do défice para a dívida pública, então a cerca de 55% do PIB, para escapar a sanções da UE. Contabilidade habilidosa.

Pagar os juros e amortizações da dívida pública, incluindo estes valores nos orçamentos subsequentes, e tentando equilibrá-los o melhor possível é, para mim, a forma mais segura de lidar com o problema. Muitos governos fazem-no e o nosso não é excepção. Como é possível fazer isso? Simples, o crescimento económico mais uma vez. Se o crescimento mais a inflacção superarem os juros será bom negócio para o Estado posterrogar os pagamentos das amortizações da dívida para anos seguintes.
Devo acrescentar que o juro pago pelo estado anda pelos 3,5% ao ano, como a inflação mais o crescimento superam, quase sempre, este número é possível sustentar este tipo de política.
O que é certo é que quando a dívida pública atingir o patamar dos 60% do PIB acaba a almofada de absorção. O Estado terá mesmo de transferir verbas do orçamento para reduzir a tal dívida se esta crescer mais do que o PIB. E num aspecto JCD tem razão, só é possível amortizar a dívida pública (de forma absoluta) se as receitas do orçamento superarem as despesas correntes.
Estamos num reino de definições. Eu incluo amortizações, pelo menos algumas, de défices anteriores na despesa do OE seguinte. Se não for hoje será no momento em que a dívida atingir o tecto de 60% do PIB.

Um choque fiscal? Mas um choque fiscal obriga a um défice superior, mais uma vez um cobertor curto. A solução passa por descer impostos gradualmente mantendo défices baixos, mas positivos, senão vamos esperar eternamente sentados à espera da mulher da fava rica e da tal baixa de impostos que nunca virá.

Que mais fazer? A resposta a Jaquinzinhos é simples: vender todas as empresas públicas, CGD incluída. Vender a RTP e as Rádios Públicas. Vender as águas, vender a TAP. Vender terrenos do Estado. Vender imóveis não necessários. Vender o ouro. Tentar vender a ilha da Madeira se possível! Apostar numa fiscalização rigorosa do tecido económico. Gastar mais dinheiro na fiscalização da fraude fiscal. Gastar dinheiro na simplificação administrativa e na redução da burocracia. Reduzir a dívida pública com as receitas extraordinárias e baixar os impostos consequentemente. Esperar crescimento com atracção de capitais estrangeiros. Despedir funcionários públicos para um nível que assegure eficiência à medida que o crescimento absorva o pessoal despedido. Diminuir o peso do Estado como agente económico directo. Mas começar sempre por aliviar a carga fiscal sobre a economia.

Depois de reduzir a dívida e os juros associados manter a aposta na conservação do património, gastar o dinheiro dos impostos não a servir dívidas estruturais, mas na investigação. Gastar dinheiro em projectos de cooperação entre universidades e empresas. Apostar na inovação e em actividades de elevadíssima produtividade e de valor acrescentado elevado. Crescimento baseado na mão-de-obra infantil já passou à história. Tecidos e calçado são produzidos na Índia e na China a uma fracção do que custa aqui. Apostar no meio ambiente de forma a tornar o país interessante para turismo de alta qualidade e para os que cá vivem. Finalmente apostar na cultura, pois um país sem elites não pode crescer. Sim gastar dinheiro na Ópera e em Belgais é essencial à identidade nacional, ao prestígio de Portugal, ao orgulho dos seus habitantes. É dinheiro bem gasto. Dá capital humano. E ninguém substitui o Estado nessas funções. Enfim, olhar para a Irlanda, a Áustria... Nunca esquecer a solidariedade, os impostos são a forma de corrigir desequilíbrios sociais. Todos os seres humanos têm direito à dignidade. A única dignidade que o liberalismo económico, puro e duro, concede às pessoas de fracos recursos e excluídas socialmente é a possibilidade de morrerem na sarjeta, sejam novos ou velhos, doentes ou saudáveis, trabalhadores ou preguiçosos.

Finalmente mostro a tabela em que se vê uma redução drástica da carga fiscal, com inflacção mais crescimento em 4% e sem aumento de impostos para as gerações futuras! Aproveitei as objecções de JCD neste post e agradeço a sugestão de separar os défices, assim mostra-se muito mais claramente o ponto da minha argumentação. Baixei os impostos suportando défices (à la Jaquinzinhos) durante os ciclos de abaixamento dos impostos. Creio que o crescimento teria disparado com este modelo. A carga fiscal teria sido reduzida em 3% ao fim de dez anos. Chamei défice à la crítico a toda a dívida acumulada do Estado somando-lhe sempre para o ano seguinte o novo défice corrente, tudo acrescido dos juros devidos a cada ano, é um valor agregado. Sobe sempre em valor absoluto como JCD dizia, mas mantém o seu rácio com o PIB constante. Como a dívida pública face ao PIB fica constante o esforço que as gerações futuras terão para a pagar é igual ao actual. Consequência final: baixei os impostos no presente e a dívida não vai exigir maior carga fiscal no futuro do que exigiria hoje, QED.

Como expliquei a João Miranda anteriormente, prefiro tirar carga fiscal às empresas assumindo o Estado um défice, do que deixar as mesmas empresas recorrer à banca onde o dinheiro é mais caro. É uma opção estratégica.

O que é certo é que défice hoje não acarreta aumento da carga fiscal no futuro. Posso antecipar queda nas receitas fiscais para acelerar a economia sem hipotecar o futuro. Nota final na polémica: o senso comum é enganador em ciência. Apenas o recurso às equações pode responder a questões da ciência. A economia não é uma questão de opinião.

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