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8.6.04

Matemáticos 

Conheci ontem um matemático. Os matemáticos são por norma pouco expansivos. Têm dificuldade em saltar dos números para a vida. Mas este matemático está a fazer um doutoramento em pedagogia da matemática e gosta de ensinar, indiferentemente, alunos de faculdade ou de liceu. E gosta de trocar por miúdos a teoria de Euclídes, de Pitágoras ou de Sharkovsky. E garante-me que não existe efeito borboleta, quando muito um efeito dominó porque uma vez accionado um mecanismo logo se accionam as devidas compensações, pelo que é difícil que uma acção desencadeie reacções até ao infinito.
Pois este matemático é madeirense. E começou a trabalhar aos sete anos. Na indústria de vimes do pai que antes do 25 de Abril empregava mais de cem pessoas e a numerosa família e que hoje está em extinção. Foi aí que aprendeu a separar os vimes para as mulheres da casa entrançarem e tinha que os agrupar em feixes de 20 e tinha que ir à loja com o dinheiro contado para não ter que carregar com trocos. Pelo que tinha que calcular a quantia exacta da despesa. É assim que os talentos surgem. Com uma semente e um contexto que a faz germinar. E o fermento da capacidade de trabalho. Só a partir pedra, a cumprir horários das 9 às 17h, a cumprir rotinas e a ter vidas que outros achariam monótonas, se pode alcançar um movimento de clarividência, de fulgor, de iluminação.
Do tédio, da disciplina nasce a obra de arte, a invenção, a descoberta, o que faz mudar a vida dos homens, o clarão na noite escura.

Clara

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