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7.5.04

E o fagote tocou bem 

Tocou muito bem, os terríveis stacattos de Rossini sairam limpos e com garra. Os clarinetes também estiveram bem. O resto não comento muito, coisas más demais para serem verdade. O trompete não limpou tudo, médio, mas a medo. Trompa a patinar, flautim a desafinar, sopros pouco coesos nas entradas, sempre pouco limpas. Violinos com som feio e sem coesão, notas trocadas abomináveis em momentos de grande rendilhado e delicadeza, estas notas trocadas em notas muito agudas pareciam os sons de gatos a guinchar com o rabo pisado. Simplesmente horrível, cada nota trocada uma facada em Rossini e nos nervos de quem ouve. É tempo de as notas trocadas serem meros, e raros, azares que passam bem no meio da musicalidade geral. Hoje já não é tempo de dar notas trocadas em cada meia dúzia de compassos por falta de estudo e de concentração, isso não, é inadmissível em músicos profissionais de qualquer orquestra civilizada. Houve notas trocadas para todos os gostos, nas cordas (sobretudo violinos) e nos sopros, um compositor contemporâneo poderia fazer uma nova partitura só com as notas erradas...
Rossini é difícil, requer estudo e não tocar para onde se está virado. Certo é que no tempo da estreia a coisa deveria ser muito pior de ouvir. Como seria em 1814-20?
Com orquestras formadas à pressa com instrumentistas quase amadores e instrumentos de sopro intocáveis? Com uma orquestra bem melhor, 50 anos volvidos sobre o "Turco In Italia", Wagner desistiu de levar o Tristan à cena em Viena depois de 77 ensaios!
Será que estamos demasiado exigentes com as orquestras de hoje? Creio que não, o ideal de perfeição musical hoje é mais exigente; existem termos de comparação muito elevados que provam que a qualidade é possível.
Felizmente a afinação correu melhor que o habitual nas cordas. Mas a orquestra andou toda a ópera a correr atrás dos cantores sem fazer o suporte correcto e sempre a deslizar ritmicamente.

O maestro desiludiu, perfeito em entradas, quadrado na regência, tudo igual na dinâmica, tudo uniforme na agógica, sem sal, sem perceber o que é uma partitura de Rossini e o seu sentido de humor, faltou humor na direcção. Um bom estudante de regência, um maestro vulgar em compreensão musical.

Os cantores estiveram muitíssimo bem com a excepção de Susana Teixeira, Mário João Alves já nem surpreende, é um valor certo que deveria ser mais aproveitado, contou com rigor e com espírito, muito bom este tenor português. Sobre os outros deixo a apreciação para mais tarde, apenas uma nota negativa para a voz muito descolorida sem corpo, anasalada, mal emitida, de Susana Teixeira. Não se percebe como se pode deixar esta cantora cantar com Candia, Vinco, Forte, Corbelli e mesmo com Edwards e Mário Alves. Ao nível de uma cantora de coro, mas que deve evitar cantar os solos. Claramente abaixo do naipe excelente com que contracena, da primeira à última nota.

Claro, estou a escrever sobre "O Turco em Itália", uma obra pouco escutada de Rossini, por alguma razão será. Creio que, nesta récita, se percebeu a razão do esquecimento da partitura. A música genial do mestre da intuição musical acaba por entrar, nesta obra, em repetição de fórmulas. Necessitaria de uma direcção transcendente para transformar um espectáculo agradável, e até divertido, em algo que poderia ter sido muito bom.

Como a hora vai adiantada mais tarde comentarei e desenvolverei as minhas apreciações desta produção do S. Carlos, apreciação globalmente positiva, mas a corrigir defeitos, os instrumentistas devem estudar mais e evitar os erros apontados hoje. As récitas seguintes devem ser mais cuidadas para se conseguir uma melhor fruição da obra.

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