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17.4.04

Uma crítica atrasada que deve ficar feita e registada 

1,2 e 3 de Abril de 2004, 19:00 no Grande Auditório da Gulbenkian, Paixão Segundo S. João de Bach.
Nomes dos intérpretes e apreciação individual resumida no final.

Uma Paixão Segundo S. João de Bach na Gulbenkian dirigida por um fóssil interpretativo: Michel Corboz, com alguns solistas de má qualidade, por exemplo um baixo que mais parecia um astrólogo, incapaz de articular com limpeza as escalas que Bach lhe entregou, um tenor sem voz nem articulação para as árias, uma interpretação geral descuidada, incoerente com o estilo: nem barroca nem romântica a meio cominho mas cheia de vícios como vibrato excessivo na orquestra, na qual poderia apontar mil e um detalhes. O trabalho do baixo contínuo foi muitíssimo irregular, com um organista despistado a esquecer-se de acordes do cifrado uns atrás dos outros e incoerente na sua aplicação. O maestro foi também incoerente nas suspensões dos corais, o que é costume em Corboz, faz as suspensões quando acha que deve fazer sem regra nenhuma. Sem critério musical ou musicológico.

Os elementos melhores foram o evangelista, a soprano, a contralto, o Cristo, o coro e a gamba. Uma nota para o bom coro da Gulbenkian que, apesar de ser o parente pobre da Fundação Gulbenkian, acaba por ser um dos maiores trunfos da casa e que é desperdiçado, desaproveitado a fazer Bach com milhares de cantores, de forma mastodôntica e arrastada, quando está um enorme reportório coral sinfónico para ser feito à espera de um coro com a qualidade do coro Gulbenkian.
Salvaram-se alguns cantores e a música eterna de Bach. Bach é difícil de destruir, a qualidade intrínseca da sua música resiste mesmo a um Corboz incapaz de dominar a moderna orquestra Gulbenkian, orquestra sem idiomática barroca, Corboz é incapaz de escolher um naipe de solistas homogéneo. A audição acabou por se revelar agradável na segunda performance mercê dos lados positivos apontados, a primeira foi muito má.
O pior de tudo é que a Gulbenkian continua a entregar a Corboz as Paixões de Bach, o pior de tudo é que não se percebe que interpretações de Bach sem assumirem qualquer lógica interpretativa, com violas da gamba barrocas misturadas com violoncelos modernos, cantores a cantar à barroca com contínuo quase apropriado à obra mas misturado com violoncelo e contrabaixo modernos, tocados sem qualquer sensibilidade barroca, a destruir completamente qualquer verosimilhança interpretativa, o pior não é estarem instrumentos modernos misturados com antigos, o pior é aquilo ser uma confusão, uma salganhada de estilos misturados num pastiche em que não se percebe qualquer racional, qualquer pensamento, qualquer lógica. Uma bola preta para a Gulbenkian que continua a insistir em tais programas que serão sempre incapazes de responder ao propósito musical da fruição de um espectáculo coerente, sempre desequilibrados estes concertos, bons momentos, excelente música, mas grande pobreza intelectual e emocional.
Acabou por ser suportável, agradável, mais pela obra e certos momentos do que pela interpretação global.

CORO GULBENKIAN - Bom.
ORQUESTRA GULBENKIAN - Banal, muito má nas cordas a solo, violoncelo com interpretação péssima do que é um baixo contínuo em Bach, vibrato desmesurado e completamente errado.
MICHEL CORBOZ (maestro) - Um fóssil musical, bom na direcção coral, fraco no domínio de uma orquestra, ainda tem alguma musicalidade mas muitos furos abaixo do que foi em tempos.
LETIZIA SCHERRER (soprano) - Muito bem.
HELENA RASKER (contralto) - Muito bem,
WERNER GÜRA (tenor) Evangelista – Excelente, articulação clara, expressividade, narração exacta, voz bem colocada e bem projectada, agudos fáceis.
RAY M. WADE JR. (tenor) - Fraco. Voz fraca, magra, respira mal, não tem ainda maturidade para cantar a solo as árias de uma Paixão de Bach, a ária "Erreweghe..." saiu um desastre, uma das mais difíceis páginas de todos os tempos entregues ao tenor não poderia ser cantada por alguém com tão pouca maturidade vocal e interpretativa.
MARCOS FINK (barítono) Cristo - Muito bom. Tem uma voz requintada, aveludada, muito rica, e fez o papel na perfeição.
MICHAEL SCHOPPER (baixo) Astrólogo de serviço nas árias- Bom nos recitativos, mau nas árias, articula mal, não tem agilidade vocal. No primeiro dia foi desastroso, parecia um elefante numa loja de porcelanas a destruir as notas que Bach escreveu, ritmo desacertado, stress nas entradas, muitas falhadas, notas erradas na segunda ária. Corrigiu e esteve um pouco melhor no segundo dia, mas a articulação não consegue melhorar, não tem capacidade nem agilidade para a ária em que se caminha para o Gólgota, com uma torrente vertiginosa de escalas e de semicolcheias, um facto que Corboz não pode ignorar.
MARCELO GIANNINI (órgão) - Descuidado, desatento.
JUAN MANUEL QUINTANA (gamba) - Impressionou bem.

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