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15.4.04

Carnívora ou vegetariana? 

Peter Singer e Coetzee

Pois estive neste fim-de-semana a comer uma belíssima empada de coelho bravo especialidade d’A Escola, que recomendo, perto de Alcácer. “A Escola” porque reformou uma dessas escolas públicas que o “Botas” nos deixou que não só resistem, como não há câmara que se preze que não as recupere.
Levava na bagagem um livro inofensivo, leve, do J.M Coetzee, “ As vidas dos Animais”, uma ficção que retoma as questões que Peter Singer veio deixar a Portugal em Fevereiro do ano passado e que são basicamente as questões dos direitos dos animais, onde Coetzee se lembra de tornar atraentes questões teóricas filosóficas que lhe são caras, com a dos direitos dos animais.
Peter Singer, por exemplo, tinha-nos dito que deitava ao lixo a tradição Judaico-Cristã a favor dos seres humanos enquanto seres especiais, que Deus criou à sua própria imagem e a quem deu domínio sobre os outros animais. E outras coisas bem mais polémicas: que desde que o possamos, deveríamos reduzir a quantidade de sofrimento no mundo, desde logo com os animais em laboratórios e nos matadouros (este último um mal moral superior porque envolvendo mais carnificina). Para já não falar de outras propostas que lhe valeram acusações de nazismo, como a aceitação da eutanásia. Disto tudo fala ele em Ética Prática, onde propõe uma nova ética por “ a ética tradicional não ser mais sustentável”.
Também Coetzee, neste livro nos diz, através de Elizabeth Costello, que numa tradição que remonta a Descartes, separámos os animais do homem, a partir da razão, e fechámos-lhes o coração, a capacidade de compreender e imaginar como é ser um animal em sofrimento, para evitarmos que nos perturbem. Partilhamos com os animais bem mais do que imaginamos, pelo menos, a capacidade de sentir dor e a capacidade de sofrer. Costello chega a comparar o comportamento humano para com os animais com o comportamento dos nazis para com os judeus, como já fizera um dos personagens de Isaac Singer. Coetzee e Singer parecem coincidir neste ponto de que o poder impõe a razão e os fortes podem fazer o que quiserem com aqueles que se encontram sob o seu domínio.
Mas quais as consequências de um reconhecimento deste pretensos direitos dos animais, que aliás não têm mais de 150 a 200 anos, na tradição ocidental? Nas palavras de Peter Singer : “ seríamos forçados a efectuar mudanças radicais na forma como tratamos os animais, o que teria implicações relativamente à nossa alimentação, aos métodos de criação de animais, aos processos experimentais em muitas áreas da ciência”.
Ou tal como o próprio Coetzee refere pela voz de outra personagem: “ Parece-me que o nível de comportamento que pretende modificar é demasiado básico..O carácter carnívoro exprime algo de verdadeiramente profundo acerca dos seres humanos...Eles gostam de comer carne. Há algo de atavicamente de atavicamente satisfatório em comer carne”.

CMC

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