23.3.04
Por uma vez
Seabra na sua crítica do Público diz tudo. A ópera "Os Fugitivos" é de fugir, como eu já disse aqui.
Sem inovar absolutamente nada o compositor José Rocha ainda consegue tecer uma teia musical minimamente profissional. Mas para um homem que colocava coros de cãezinhos de peluche a ladrar (ao menos estes coros conseguem-se ouvir) um homem que usava a ironia e o humor como uma forma estimulante de criação cai aqui num trabalho monótono e de pendor academista, com o a querer provar que sabe realmente compor para instrumentos a sério.
O pior mesmo é o inacreditável libreto de Zink, banalidades, estilização infecunda das personagens e um desfecho que só um puto do liceu se lembraria para sair do impasse a que acção dramática, praticamente inexistente, conduziu. Um beco sem saída, sem originalidade nem qualidade literária no texto, uma inconcebível e monótona sucessão de quadros, com caracterizações triviais e previsíveis dos personagens, já vistos e revistos em milhares de peças: a mãe complacente, o pai frustado, o filho político, palavroso e com uma mancha terrível no passado, uma inacreditável "maluquinha de Arroios" do consumismo, personagem não-personagem, que nada traz e sem qualquer ligação dramática ou interacção com os outros elementos. A luta contra a globalização aqui é tão pateta e desconexa como todo o resto do libreto. Afinal estamos numa Ópera do Tempo? Se estamos porquê a marca da "tragédia" falsa e sem densidade? Uma ópera do tempo com o elemento fantástico? Com um deus ex machina? Que afinal é o diabo, e que surge do toxidependente, figura também banal, que no contraponto de classes começa por ser um elemento menor e que acaba por ser a gota de água que demonstra que nesta mecânica teatral nada funciona.
Descobrimos, para nosso "espanto" como não fosse evidente, que a solução de Zink iria surgir sem qualquer rasgo: na peça está tudo morto, incluindo o engenho do libretista. De facto estão todos na barca do inferno, onde oh!... suprema moralidade de pacotilha, a heroína, a personagem boazinha da história: Marta a segurança pessoal do político, que passou toda a peça sem se perceber qual o seu papel ali, vai desembarcar e salvar-se, vivinha da costa nas costas do inferno, depois de feita a travessia. Porra! Já não há pachorra para teatro de liceu, depois do Freitas do Amaral e as suas peças de menino da escola primária vem o "intelectual" Zink apresentar as suas meditações escolares.
Isto de se mandar umas bocas e ter alguma graça, isto de se ser mediático não garante qualidade, nem bilheteira. Mais uma prova: este triste espectáculo que nem sequer atinge o nível do bocejo...
Sobre cenografia Seabra diz tudo.
Os músicos foram muito profissionais e Cesário Costa, o maestro, é um valor seguro, concentrado, pensado. Cesário Costa sempre que o vejo a dirigir e ouço o resultado sinto uma afirmação de qualidade. Seria com jovens deste calibre que o S. Carlos se deveria renovar. Como será Cesário a dirigir um repertório menos contemporâneo? Creio que deve ser excelente, uma carreira a acompanhar.
Os cantores estivem em bom plano, sem destaques. Seabra esquece a soprano ligeiro Sara Braga Simões, muito certa, bem colocada, uma voz sem grande segundo harmónico, e não muito pujante, mas de voz bonita e correcta. Pena a ingratidão das linhas melódicas.
Música e Dramaturgia: José Eduardo Rocha - 9.5
Libreto: Rui Zink - 5
Direcção Musical: Cesário Costa - 16
Encenação: Paulo Matos - 10 (com este material como se pode encenar?)
Cenografia: José Manuel Castanheira - 5
Figurinos: Rafaela Mapril 10 (com esta peça não pode brilhar?)
Desenho de Luz: Vítor Correia 12
Interpretação:
Mário Redondo..................Roberto
Sara Braga Simões...........Marta
José Corvelo.....................Alfredo
Elmira Sebat....................Elisa
José Lourenço..................Ferlucci
Catherine Rey....................Cremilde
Ensemble Instrumental da Metropolitana 13
Produção: Teatro da Trindade/INATEL
Sem inovar absolutamente nada o compositor José Rocha ainda consegue tecer uma teia musical minimamente profissional. Mas para um homem que colocava coros de cãezinhos de peluche a ladrar (ao menos estes coros conseguem-se ouvir) um homem que usava a ironia e o humor como uma forma estimulante de criação cai aqui num trabalho monótono e de pendor academista, com o a querer provar que sabe realmente compor para instrumentos a sério.
O pior mesmo é o inacreditável libreto de Zink, banalidades, estilização infecunda das personagens e um desfecho que só um puto do liceu se lembraria para sair do impasse a que acção dramática, praticamente inexistente, conduziu. Um beco sem saída, sem originalidade nem qualidade literária no texto, uma inconcebível e monótona sucessão de quadros, com caracterizações triviais e previsíveis dos personagens, já vistos e revistos em milhares de peças: a mãe complacente, o pai frustado, o filho político, palavroso e com uma mancha terrível no passado, uma inacreditável "maluquinha de Arroios" do consumismo, personagem não-personagem, que nada traz e sem qualquer ligação dramática ou interacção com os outros elementos. A luta contra a globalização aqui é tão pateta e desconexa como todo o resto do libreto. Afinal estamos numa Ópera do Tempo? Se estamos porquê a marca da "tragédia" falsa e sem densidade? Uma ópera do tempo com o elemento fantástico? Com um deus ex machina? Que afinal é o diabo, e que surge do toxidependente, figura também banal, que no contraponto de classes começa por ser um elemento menor e que acaba por ser a gota de água que demonstra que nesta mecânica teatral nada funciona.
Descobrimos, para nosso "espanto" como não fosse evidente, que a solução de Zink iria surgir sem qualquer rasgo: na peça está tudo morto, incluindo o engenho do libretista. De facto estão todos na barca do inferno, onde oh!... suprema moralidade de pacotilha, a heroína, a personagem boazinha da história: Marta a segurança pessoal do político, que passou toda a peça sem se perceber qual o seu papel ali, vai desembarcar e salvar-se, vivinha da costa nas costas do inferno, depois de feita a travessia. Porra! Já não há pachorra para teatro de liceu, depois do Freitas do Amaral e as suas peças de menino da escola primária vem o "intelectual" Zink apresentar as suas meditações escolares.
Isto de se mandar umas bocas e ter alguma graça, isto de se ser mediático não garante qualidade, nem bilheteira. Mais uma prova: este triste espectáculo que nem sequer atinge o nível do bocejo...
Sobre cenografia Seabra diz tudo.
Os músicos foram muito profissionais e Cesário Costa, o maestro, é um valor seguro, concentrado, pensado. Cesário Costa sempre que o vejo a dirigir e ouço o resultado sinto uma afirmação de qualidade. Seria com jovens deste calibre que o S. Carlos se deveria renovar. Como será Cesário a dirigir um repertório menos contemporâneo? Creio que deve ser excelente, uma carreira a acompanhar.
Os cantores estivem em bom plano, sem destaques. Seabra esquece a soprano ligeiro Sara Braga Simões, muito certa, bem colocada, uma voz sem grande segundo harmónico, e não muito pujante, mas de voz bonita e correcta. Pena a ingratidão das linhas melódicas.
Música e Dramaturgia: José Eduardo Rocha - 9.5
Libreto: Rui Zink - 5
Direcção Musical: Cesário Costa - 16
Encenação: Paulo Matos - 10 (com este material como se pode encenar?)
Cenografia: José Manuel Castanheira - 5
Figurinos: Rafaela Mapril 10 (com esta peça não pode brilhar?)
Desenho de Luz: Vítor Correia 12
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Mário Redondo..................Roberto
Sara Braga Simões...........Marta
José Corvelo.....................Alfredo
Elmira Sebat....................Elisa
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Produção: Teatro da Trindade/INATEL
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