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30.4.07

"NO DIVà COM SATÔ de Tomás de Oliveira Marques 

"NO DIVà COM SATÔ

Composição ditirâmbica
À vista da Torre de Belém
Com o fito mefistofélico
Dos meninos se portarem bem



I. “Mea Culpa”

Santana, pelo túnel perdoa
Ataquei-te ao mínimo cabelo.
Agora, quando saio de Lisboa,
Sinto que fui já Velho do Restelo.

Tal qual o pudico Centro de Belém
Face à barbárie apodei de Comercial,
Ao deixares o poleiro deixei por bem
O que o Mosteiro ladeia de achar mal.

Pois é, isto de ser a sério intelectual
De esquerda que para o centro corre
Tem que se lhe diga, faz rir, sobretudo
No mundo onde o siso dorme e julga mal
O jugo do qual a banalidade incorre
Em erro para afinal “acertar” em tudo.

Eis-me por fim deitado no divã
Do resto da vida a ouvir Josquin **
Preso ao medo de estar por um fio
Trocar a música que tolhe Satã
Pela de “Passa por mim no Rossio”.

** (É isso mesmo: Josquin, sec. XV, e não Chopin)

27/04/2007
Tomás de Oliveira Marques



II. “Do direito à vida”

Até Quinhentos, a mulher não existia
Não tinha alma, antes de Trento.
Depois, mesmo sem a ecografia,
Talvez por milagre, a Igreja teve tento.

Tento tolhido na estulta tentação
Dos loyolas em “cogito lingus” com o poder.
Vai daí, sopra supra a Inquisição
Foi p’rá queima o direito de viver.

Repete-se agora a triste história
Com bolor, passado meio milénio.
Há textos, ecografias, falta memória
Da treta a tratar-se por quinquénio.

Fica então o direito à vida assente
Por cálculo ou cegueira por quinquénio.
Mas, face à trela da tecnologia, o crente
Tropeça agora tal qual há meio milénio.

30/11/2006
10/02/2007
Tomás de Oliveira Marques


III. “IVG”

Crescei e multiplicai-vos
Em prol de uma prole de trela
A encher o planeta de fedelhos
Apenas para parir conselhos
Sobre isto e aquilo sem parar
De pensar no sexo a solução
Do tempo, d’abjurar e abortar
Tendo em conta na alma os pintelhos
Da subtil arte da proliferação
Perdida à partida a favor dos coelhos.

08/02/2007
10/02/2007
Tomás de Oliveira Marques



IV. “Discernimento I”

Deus existe.
Vi-O há tempos, atrás
De uma moita moído
A esconder-se condoído
Dos seus mais ferozes
Publicita-dores.

2005
Tomás de Oliveira Marques



V. “Discernimento II”

De pés juntos e sonhos
Para a frente esticados.

Na barriga, como os defuntos,
Os dedos para sempre cruzados.

Assim apontamos o futuro
Ao vê-lo de olhos fechados.

Ah, como sabe bem o chão duro
Ao batermos as asas nele deitados.

10/04/2007
Tomás de Oliveira Marques



VI. “NO DIVÃ COM SATÃ - Epílogo”

Satã, até à próxima
Hás-de de novo voltar
Dos vãos trabalhos de parto
Na senda do cerne da Dor
A este divã tuas penas partilhar
Desta vez contigo, angélico leitor.

29/04/2007
Tomás de Oliveira Marques

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28.4.07

Populaça? 

Lido na TSF online:

"Miranda Calha anunciou ainda que «chegou o momento de perguntar» à populaça de Lisboa se será útil continuar com este executivo na câmara e acrescentou que,... blá blá blá..." Sublinhado colorido meu!

Populaça? Já voltámos aos tempos que Fernão Lopes tão bem descreve, será que Miranda calha encalhou de vez, ou serão os jornalistas que encalharam?

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27.4.07

Mstislav Rostropovich è morto 

Um vinil e dois concertos, tinha eu 10, talvez 11 anos. Academia de St. Martin in the Fields, Haydn, no violoncelo, e se não me engano também a dirigir, estava Rostropovich. Foi assim que ao longo das espiras, repetidas vezes sem conta, daquele vinil, o som profundo, rouco e poderoso do mestre russo ia entrando pela minha alma. Dó e ré, este último de atribuição duvidosa segundo alguns. Mas isso não me interessava muito, o que me interessava era o som daquele instrumento sem par. Vejo este passado como se fosse noutro século, algo que vivi talvez em sonhos. Rostropovich, Rubinstein, Gilels, Richter e Richter, Oistrach, Arrau, Carlos Kleiber, Karajan, Leonhardt (que vi em Sines num instante também mágico alguns dias atrás) e mais outros tantos, tantos nomes que povoaram os anos em que fui descobrindo a música com o encaminhamento do meu pai, que me ia levando aos concertos da Gulbenkian, e dos meus avós.
Muitos anos depois deste Haydn de sonho, hoje mesmo, uma frase sussurante dita em italiano dizia-me que Mstislav Rostropovich tinha morrido, dias depois de se saber que tinha cancro.
É assim a vida, os antigos morrem e sobram, poucos, os novos que lhes vão tomando o lugar, apesar dos arpejos que um braço percorre num prelúdio de uma qualquer suite nº 4 de Bach sob o olhar de Deus, numa Igreja de França ou algures num céu numa dimensão diferente da nossa, intangível... estou desconexo, fico sempre desconexo perante o que me transcende. Nem sequer vou corrigir este parágrafo.
Cada vez que um destes homens morre, goste-se ou não do estilo, com mais ou menos vibrato, com mais ou menos história e informação em cima, morre um pouco da nossa alma. Há cada vez menos homens destes para morrer... num mundo onde vão deixando a lenda nas nossas memórias pessoais e muito esquecimento.
A calma serena de Rostropovich em todos os momentos, a contenção, a inteligência e maturidade, a seriedade com que se entregava às coisas, são atributos de um tempo que não volta. Não volta porque é morto o instante em que o arco se levantava e a respiração se continha numa profunda inspiração para uma Courante que se movimentava como a vida numa linha contínua de contração, distensão. Fluidez e retórica. A análise que Rostropovich faz das suites de Bach que se divide em textura, estrutura e ritmo, atinge o âmago da obra feita das coisas simples e despojada de efeitos supérfluos, superiormente levada à prática.
Rostropovich é vida feita música, música que ecoa pelas minhas veias, pela minha cabeça, escuto agora a Sarabanda da suite nº1 de Bach, e choro. Não se pode escrever nada assim...

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26.4.07

Regionalização outra vez? 

O bando de corruptos do costume, vindos dessa tremenda chaga portuguesa do suposto poder local democrático, volta à carga com a regionalização.
Depois de destruirem Portugal durante mais de trinta anos, de forma sistemática e irreversível, os ditos senhores querem mais poder e mais dinheiro. Alegam que sem regionalização não haverá ninguém no interior...
Dizem que este modelo falhou. O problema não são os modelos, o problema são as pessoas em geral com a classe polítca à frente: inculta, corrupta, incompetente.
Tenho o maior desprezo pelos políticos que considero geralmente mesquinhos, desprezíveis, velhacos desleais prontos a espetar a faca nas costas do próximo na primeira oportunidade e, basicamente, sem escrúpulos. O pior é que sendo geralmente estúpidos são também, em muitos casos, muito espertos, o que é diferente de serem inteligentes, ou assim se julgam. São uma espécie de galeria de exemplos do pior que a espécie humana consegue produzir, e consegue produzir espécimes muito maus, uma espécie de concentrado de vícios da sociedade em geral. Tipos ambiciosos pela ambição e sem nada dentro, rapazes falhados nas universidades que acabaram por fazer vida a partir das associações de estudantes, homens de mão dos empreiteiros, caciques locais, vigaristas grosseiros, incapazes de terem uma profissão digna por preguiça ou incapacidade, enveredam pela política, sem ideologia, sem filosofia, a política é apenas um expediente de vida. Concordo em tudo com Schopenhauer no seu pessimismo: o ser humano é vil e mesquinho com muito poucas excepções. Na classe política as excepções acontecem de centenas em centenas de anos. Como tal, dar mais poder a esta gente, e logo à gente do escalão intermédio, é contribuir para piorar ainda mais as coisas. Nunca.

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25.4.07

Alguém que me explique isto dos dias da música 

Não fui aos "dias da música" dedicado ao piano no CCB, tinha mais que fazer, as ervas cresciam, os pássaros cantavam e era preciso pensar.

Entretanto preciso que alguém me explique umas coisas.

Mega Ferreira disse que René Martin era um despesista e que os orçamentos do francês eram sempre largamente ultrapassados. Fiz umas contas para estes dias do piano:


Orçamento inicial 400.000 euros. Custo final: 600.000 euros. Derrapagem orçamental 50%. Afinal quem é o despesista?

30 pianistas, alguns nem devem aparecer no google. Concertos a solo e a duo. Muitos eram pianistas portugueses, mais baratos por causa das viagens, e algumas orquestras: Orquestra de Câmara Württemberg, ORCHESTRUTOPICA, Orquestra Metropolitana, Orquestra Filarmónica da Eslováquia.
Serão 250 músicos no máximo, com muita caridade, mais os 30 pianistas, um percussionista e um cravista. Ficou, mais coisa menos coisa, a cerca de 2100 euros por músico (onde se incluem os músicos das orquestras, que são pagas sempre da mesma forma tabelada e institucionalizada). Conclusão: os preços pagos pelo CCB aos solistas são muito mais elevados do que nos tempos de René Martin e não são inferiores a preços de concerto normal, não existe qualquer economia de escala. Um recital aqui ou num outro lado qualquer é ao mesmo preço. Não seria melhor fazer uma temporada superior com estes 600.000 euros gastos num fim de semana?
E a fantochada dos putos a martelar nos pianos com os pais embevecidos a verem a rapaziada a escavacar os pobres instrumentos?... Será que é isto a educação musical de fundo que Portugal precisa, será isto um projecto educativo com pés e cabeça? Cruzamentos de pianos com girafas?... E os jornalistas, imbecis como de costume, também eles embasbacados com a dita fantochada, santa imbecilidade lusitana... Entretanto tocam pianistas como Pascal Rogé e ninguém diz nada e só a Maria João Pires e o Laginha é que são notícia?

Custo de 2006: 1.200.000 euros (o dobro). Número de concertos: 115. Músicos 857. Feitas as contas fica a 1400 por músico, e que músicos, além disso vindos (mais de 450) do estrangeiro, com viagens a pagar pelo CCB. Cito de memória alguns nomes.

Orquestras: Ricercar Consort, Les Siècles, Sinfonia Varsovia, Akademie für Alte Musik Berlin, Collegium Cartusianum, Concerto Köln, La Fenice, Divino Sospiro, Ensemble Matheus, Solistes de l’Ensemble Baroque de Limoges, Ensemble 415, etc, etc.

Coros e ensembles vocais:
Ensemble Vocal de Lausanne, RIAS-Kammerchor, Kölner Kammerchor, Coro de Câmara de Namur, The Tallis Scholars, La Venexiana, etc...

Inúmeros agrupamentos de câmara e solistas e maestros de renome mundial: Ensemble Pierre Robert, Skip Sempé, Carlos Mena, Tharaud, Oleg, Coin, Fernandez, Pierlot, Neumann, Reuss, Jean Tubéry, Desenclos, Cavina, Hantaï, Banchini, etc...

Pelo que vejo os programas de 30 pianistas, que se bastam si próprios, e umas orquestras baratas ficam a um preço escandaloso comparado com os preços de René Martin, e a qualidade é incomparável.
É evidente que há bons artistas nos dias da música, mas dizer-se que Mega está de parabéns parece-me uma patetice de gente sem referências. Merecia umas setas para baixo, bem no fundo da escala. Além disso parece que disse que não sabia o que era a Festa da Música (segundo a imprensa). Mas será que sabe o significado da palavra modéstia?... é que soa a ridículo.
E a taxa de Mega é mais baixa que a de René, que no ano passado ultrapassou os 94% de ocupação ao contrário dos 88% deste ano. Dirão que é bom, claro que não é mau, sobretudo se olharmos para a programação apresentada, mas Réné Martin tem melhor resultado. Objectivo e linear. Mas o pior é mesmo a deselegância: Mega Ferreira consegue esta taxa de ocupação porque aproveitou o balanço do René Martin (e de Miguel Lobo Antunes), René que construiu o modelo, Miguel Lobo Antunes que o lançou em Portugal e o adaptou à nossa medida. Mega Ferreira nunca teria sequer os 70% que previa inicialmente se não fosse a aura que a Festa da Música obteve ao longo destes anos, a não ser com custos gigantescos de promoção e marketing, que obviamente não gastou neste ano. Não o reconhecer é deselegância, não o citar é ingratidão. Copia-se descaradamente e despudoradamente o modelo, faz-se uma versão baratucha que putativamente fica a um terço do custo de 2006, ultrapassa-se o orçamento em 50%, chega-se a metade do valor anterior; chamam-se, de caminho, uns nomes ao programador antecedente, finalmente até se diz que não se sabe o que é a Festa da Música, muito edificante, sem dúvida.
Onde ficamos no argumento de que se está a desbaratar num fim de semana grande parte dos recursos do CCB? Será que agora esta instituição pública não fica muito limitada na sua capacidade de programação anual?

Entretanto afirmou-se que a "crítica tinha feito um balanço positivo" destes dias do piano, mas será que esteve lá alguma crítica para além do Bernardo Mariano? Que até foi particularmente crítico...

Será que alguém me explica?

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24.4.07

"O Ouro do Tejo" de Tomás de Oliveira Marques 


O OURO DO TEJO


TETRALOGIA sob o triste e trôpego mote
“Lá vamos cantando e rindo”

Três nocturnos para despertar

I. “Portugal 2007-2009”

José Sócrates querem-te imolar
Por medo talvez ao que aí vem.

Do teu carácter a fundo nada sei
Mas por alto a solidez não custa imaginar.

O que eu sei destas “miudezas” são as razões
Dos talhantes não serem lá muito de fiar.


II. “Portugal 2005-2009”

José Sócrates querem-te imolar
No altar do medo ao que aí vem.

Do teu carácter a fundo pouco sei
Mas por alto a mal não fica bem julgar;
Ou melhor: por alto o que é baixo
Não habita em ti de modo larvar;
Ou melhor, ainda: por alto aposto em ti
A virtude em surdina com baton a bailar.

Pecados da juventude? Quem os não tem.
Estigma da portugalidade? Isso passa com a idade.
Seja o que for, para nós, nunca um santo a governar.

Enfim, tenho dúvidas e espreito o sexo
Das insinuações lançadas para te tramar.
O que eu sei destas “miudezas” é a razão
Do talhante não ser lá muito de fiar.


III. “Portugal 1143-2009”

Desconfio do homem sem um vício sequer
Da moral que sai à rua toda tapada.
E haja cuidado com o diabo nos que rezam
Em prol de um santinho a governar.


P.S.: Um santo a governar! Dado toda a regra parir uma excepção, já agora a RTP podia confirmar junto dos contribuintes (chamadas mais IVA, não esquecer) se, em matéria de santidade na governação ao longo dos nossos oito séculos desgovernados, a excepção foi, de facto, o santinho do Salazar:
Lisboa 12/04/2007
Tomás de Oliveira Marques



MAS OUTROS MAIS ALTOS VALORES SE LEVANTAM…

“Três Nocturnos em memória de Carlos Paredes”

I.

Pintar a fundo
O fundo que bordeja
As dores do seu país…

Foi o que fizeste, mestre
Sempre, só e sem medrar
Ao esgar no rosto latente
Dos que muito dão e nada
Hão-de cobrar às vidas servis.

Das tuas penas, quantos os “pátrios”
De lado as olharam e agora que te foste,
A eito já se prestam a bífidas loas.
De vergonha emudeço e a avalancha
Desses teus imensos dedos contraponho
Ao sonho cavo das línguas vis.


II.

Pintar a fundo o fundo
Da distância do âmago de si
Ao alheio que gera e cerca e bordeja
A dor de quem a sério ao espelho
Dos outros, dele mesmo por fim ri.


III.

Caminhar lesto para longe
Muito longe do ruído de fundo
No rosto estampado dos tempos que correm…

E levar connosco um punhado de notas
Raras, a dar voz ao Silêncio do Mundo
Algures na humanidade agachada
A música dos que O vivem e sofrem.

Lisboa 2005
Tomás de Oliveira Marques





… E VALORES MAIS ALTOS AINDA, ATÉ AO INFINITO…



“Das Sete Palavras na Cruz”


Nas Tuas Mãos os dados
Estão lançados, o grifo
Dos danos e a dolência
A fulgir do abismo,
Onde a Sede de Si
Por si consumar-se-á.

(Dedicado ao Quarteto Divino Sospiro, aquando da execução do sublime quarteto de Haydn, no CCB, em 03/04/2007)

Lisboa 03/04/2007
Tomás de Oliveira Marques



… MAS, HUMANO, DEMASIADO HUMANO,
LÁ TENHO QUE RETROCEDER AO QUOTIDIANO …


“From América with love”

Deixará um dia de ser permitido
O porte d’arma nas mentes embebido
Da fé – olaré – de poder à vontade matar.
Mas nem tudo está ainda perdido
Continuará a ser, por sorte, proibido
Nos “campus”, salões, na hora da morte fumar.


Ai Portugal, Portugal que bates às portas
Dos ricos e, andrajoso, não te importas
Desse filão o veio estar já inquinado;
Se daqui não te pões a pau e cuidado
Não tomas com o que às cegas importas
Aí sim, irás passar um mau bocado.


Lisboa, num Domingo
de Abril de 2007
Tomás de Oliveira Marques


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17.4.07

Concertos extraordinários 

Gustav Leonhardt, mestre dos silêncios, em Sines. Sokolov, mestre dos efeitos, em Lisboa. Simon Rattle, mestre do equilíbrio, em Salzburg. Também em Salzburg: Bronfman, mestre dos contrastes, mais Lang Lang, mestre das momices. Salzburg linda na Páscoa com uma noite transfigurada pelos solistas de Filarmónica de Berlim. Lisboa com uma encenação possível, com alguns cantores de qualidade e um maestro mediano, num Montezuma de Vivaldi... algures num teatro sem director. Tudo isso e ainda Ota e TGV num Portugal sem projecto, os próximos temas deste blogue.
Algures numa noite aqui; antes disso a reflexão e o silêncio, tão necessários neste tempo sem tempo de Primavera fugidia nas ervas que crescem sem ninguém as cortar.

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11.4.07

Diário de Notícias e Marcelino 

Marcelino não conquistou a primeira linha no "Correio da Manhã" por acaso. Não se pode ser director de um jornal de sucesso sendo como os leitores do mesmo jornal. Marcelino era muito melhor do que o leitor tipo do bom produto que produzia; bom porque lucrativo e abundantemente lido.
Marcelino conhece o leitor tipo do CM, o taxista e o dono do pequeno café de bairro, no fundo os grandes "opinion makers" de Portugal, mas não é igual ao taxista. Note-se que apesar de blogues e jornais era Marcelino que, subrepticiamente, ditava a opinião pública portuguesa através dos seus leitores tipo.
Marcelino mudou-se para o Diário de Notícias, o jornal mudou muito pouco dirão alguns, está a popularizar-se dirão outros. Nada mais falso, o jornal estava mesmo muito em baixo antes de Marcelino entrar. Marcelino mudou o seu discurso, dirão outros. Talvez seja verdade. o que é certo é que as mudanças num jornal como o Diário de Notícias têm de ser muito lentas e graduais, só assim poderá ganhar novos leitores mantendo os antigos.
Marcelino não pode competir com o Correio da Manhã. Ele sabe isso muito bem, talvez por isso se lhe note um novo discurso, mais institucional, o homem é o mesmo mas as funções são outras. As funções fazem o homem.
Exactamente como num Papa que é sempre diferente do cardeal que entrou no conclave.

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O que aconteceu a Pinamonti? 

Depois de uns dias fora pergunto: o que se passou com a carta da tutela que pedia a Paolo Pinamonti para permanecer no S. Carlos até ao final da temporada?
Segundo sei Pinamonti ofereceu-se para continuar, também por escrito.
O que aconteceu depois disso? Pinamonti saiu realmente a 31 de Março, dia do requiem de Verdi em Lisboa, estava eu na estreia do Ouro do Reno em Salzburg.

Os jornais nada disseram sobre o assunto, tentei pesquisar on-line e nada. Blogues muito pouco, o Portugal dos Pequeninos, geralmente com fontes bem informadas, pouco adiantou sobre o assunto.
O pouco que descobri, nas minhas indagações, é que a tutela depois de pedir a Pinamonti que permanecesse em S. Carlos não lhe ofereceu contrato!.
Ou seja, depois de correr Pinamonti como o fizeram, Sr. Hermenêutica e coadjutora Lima, estavam à espera que o italiano ficasse sem garantia de um vencimento e de um contrato. Evidentemente Pinamonti mandou-os passear.

Assunto encerrado, não há mais comentários. Estes ficam para a história deste período, as conclusões são evidentes, este é mais um episódio que serve para avaliação de quem tutelou o ínfimo orçamento da cultura sob o "engenheiro" Sócrates.

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10.4.07

Festival de Páscoa - Ouro do Reno - A perfeição 

Já escrevi um pouco sobre este Ouro do Reno de Salzburg, regresso agora para relembrar a força das pequenas grandes coisas. Depois de ver Vick a esforçar-se por destruir o conteúdo Wagneriano nas trapalhadas megalómanas de Lisboa, em que o sentido último das coisas foi sempre realizado em torno do ego e ideia do encenador a violar a obra mostrando quanto isso e ele próprio são magníficos. Olhem para mim: "eu é que sou o Vick, eu passo sem orquestra, sem maestro, sem música. Basto-me a mim, sem luzes, eu e o teatro, sou um génio". Este é o paradigma do encenador moderno. Ou talvez não. Depois de ouvir e ler um coro de elogios mais ou mesmo unânime, onde se destaca o próprio Sr. Hermenêutica, que parece ter adorado o conceito, não consegui resistir e tive uma pulsão imensa para regressar à encenação de Aix en Provence, agora no Festival de Páscoa de Salzburg. Encenação de Stéphane Braunschweig, direcção de Rattle, orquestra Filarmónica de Berlim.

De novo a intensa simplicidade do drama, cenografia dada pela música, orquestra personagem e factor motriz da acção. Já aqui escrevi sobre a magnificência da encenação e da música, volto para umas breves notas.
A 31 de Março, penavam os meus compatriotas em Lisboa com a Orquestra Sinfónica Portuguesa, e depois dos dias de Aix, a Filarmónica de Berlim voltou ao fosso da ópera. Wagner e o Ouro do Reno. A orquestra neste dia estava ainda mais refinada, o som era mais puro, o risco foi assumido na plena confiança de tudo poder. Rattle alterou sobretudo a violência com que a Tuba e a percussão realizaram as passagens mais sulfúreas da obra. Sem rasgar o som, os fortíssimos da tuba (incrívelmente dentro de uma estética sonora controlada) sobrepassaram toda a orquestra num efeito inusitado e violentíssimo, muito de acordo com o dragão ou com as fornalhas dos nibelungos. Os tímpanos foram também percutidos de forma violentíssima e seca, o que deu um efeito extremamente agressivo a estes momentos. Nunca tinha ouvido nada assim no Ouro do Reno, quer em gravação quer ao vivo. Ainda estou indeciso entre a crítica do efeito espúrio ou se aquilo faz sentido: em termos meramente analíticos e racionais acho desequilibrado, em termos emocionais achei fantástico, dionisíaco... Fico à espera do Siegfried dentro de dois anos, os efeitos sonoros do mesmo tipo multiplicam-se na celebração da natureza do Siegfried e Rattle provou que também consegue seduzir pela surpresa, pela experiência.

As bigornas trapalhonas de Aix foram substituidas por um efeito consistente e ritmado, violento e credível que, associado à força telúrica da tuba, criaram a máquina sonora da revolução industrial que Braunschweig habilmente capitalizou em termos cénicos.

A nota máxima de Rattle não foi, no entanto, este experimentalismo sonoro. Rattle sublinhou os detalhes e foi altamente conseguido no sentido de levar o drama para a frente, sem bloqueios. Foi propulsivo, rítmico e metódico, ao mesmo tempo que nunca deixou de ser subtil e refinado. Conduziu o canto com atenção, sublinhou o discurso, enfatizou os temas condutores. Nunca foi grosseiro ou brutal. Transparente nos pontos mais finos, como no prelúdio e primeira cena ou no momento em que as seis harpas entram no final, e telúrico nos momentos mais carregados, produziu um Wagner impossível e de sonho.
Os cantores foram quase os mesmo de Aix, fica aqui um resumo muito breve das suas actuações:
Wotan, Sir Willard White, excelente na sua idade, superou o nível de Aix quer como actor quer como cantor. Donner, Detlef Roth, superou muito a escala de Aix tendo sido muito mais consistente e imponente na sua invocação final. Froh, Joseph Kaiser, subiu de novo e muito, esteve rutilante nos agudos e mostrou-se melhor na representação. Loge, Robert Gambill, foi ainda superior a Aix, mais irónico e refinado, com a voz mais macia e subtil, esteve ao nível máximo possível. Fasolt, Iain Paterson, uma novidade no cast, talvez um pouco inferior ao nível do Fasolt de Aix provavelmente pela tensão da estreia, foi no entanto muito sólido. Fafner, Alfred Reiter, superou Aix, sendo mais brutal e profundo. Alberich, Dale Duesing, se em Aix criticámos a sua voz pequena e elogiámos a sua capacidade de composição, agora nem a voz pequena se notou tanto, esteve excelente. Mime, Burkhard Ulrich, excelente ao nível de Aix onde já tinha sido magistral, falta-lhe apenas um pouco mais de voz. Fricka, Lilli Paasikivi, esteve muito bem de novo, mesmo nível de Aix. Freia, Annete Dasch, uma nova aquisição em Salzburg que melhorou em muito o cast de Aix, Dasch tem uma belíssima voz, fresca e subtil, sem excesso de stress vocal e de vibrato; como actriz esteve atormentada pelo rapto e acabou cúmplice de Fasolt, perfeita. Erda, Anna Larsson, como sempre igual a si própria, ela é a encarnação de Erda, linda e profunda como a terra, um pequeno grande papel ao mesmo nível de Aix. Woglinde: Sarah Fox, mesmo bom nível de Aix. Wellgunde, Victoria Simmonds, superou um pouco Aix estando agora ao nível das outras filhas do Reno. Flosshilde, Ekaterina Gubanova, mesmo nível de Aix.
Como se viu se em Aix tinha sido excelente em Salzburg aproximámos o óptimo, até por questões acústicas (em Salzburg a acústica é muito superior ao velho teatro do Arcebispado). Creio ser impossível superar um tão belo e equilibrado naipe de cantores, sem nenhuma "super estrela" incluída. Bem como será quase impossível superar esta orquestra e esta direcção e conseguir uma encenação "pós-moderna" mais equilibrada com a música e o drama.

Deixámos de pensar e analisar para ouvir e sentir, retirando um prazer ilimitado da fruição da Obra de Arte Total. Finalmente.

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9.4.07

Independente deve fechar imediatamente 

Estive na Alemanha e Áustria, regressado hoje a Lisboa leio atentamente os jornais. Segundo parece Mariano Gago anuncia hoje se a Independente deve ou não fechar.

Acho estranho que seja preciso reflectir nesta decisão e anunciá-la como se se tratasse de um caso nacional. A Independente nunca foi uma universidade de prestígio, tive oportunidade de ver exames da minha área científica, a matemática, e parecem-me anedóticos pela extrema facilidade e pela ausência total de perguntas de raciocínio específico.
Como professor do Instituto Superior Técnico em Lisboa, instituição prestigiada e reconhecida pela ordem dos engenheiros, tenho falado com diversos colegas sobre a Independente, isto nas áreas tecnológicas e científicas. A conclusão é unânime: aquilo é uma espécie de escola da treta, quem não conseguia acabar os cursos em instituições exigentes, onde é necessário trabalhar no duro e aprender as competências essenciais da sua licenciatura, ia para a Independente. Assim se explica que gente com funções dirigentes de altíssimo nível consiga realizar licenciaturas que à partida seriam de grande complexidade e responsabilidade, como engenharia civil, em tempo record e ao mesmo tempo que exerciam funções a tempo inteiro. Até Armando Vara concluiu, segundo me informaram recentemente, um curso qualquer na Independente enquanto era gestor da CGD.
Sobre Sócrates nem se fala, o actual primeiro ministro teria de ser um géno absoluto para conseguir concluir uma licenciatura no meu instituto, o IST, ao mesmo tempo acumulando as funções de secretário de Estado. Imagine-se Sócrates despachando, por exemplo, o Freeport de Alcochete, lendo milhares de páginas de relatórios ao mesmo tempo que preparava o trabalho final de curso sobre hidráulica aplicada ou betão pré-esforçado, tendo de realizar experiências a tempo inteiro, e escrevendo minuciosos relatórios de projecto e investigação.

Não admira que a Ordem dos Engenheiros nunca tenha reconhecido os cursos da Independente. Espanta-me também o que vai alguém com ambições políticas fazer para a Independente. O que será mesmo: ambição do canudo? Canudo pelo canudo? É que um curso na Independente ou numa qualquer privada de uma república das bananas é a mesma coisa. Um licenciado da Independente não vale à priori como engenheiro e não tem grande currículo académico ou científico. Não está preparado para assinar projectos uma vez que não domina à priori as competências básicas da especialidade.
O que a Ordem dos Engenheiros faz nestes casos: para salvaguardar a sociedade das espécies de licenciados que saem deste tipo de escolas não concede a acreditação automática às licenciaturas. Isto uma vez que o Ministério da Educação não ia fazendo nada, e até lhe parecia convir esta situação, concedendo autorização à universidade para continuar. Parece que, ao mesmo tempo, este status quo convinha a muita gente de forma a obter cursos expresso e credibilidade canular em tempo relâmpago. Tolerava-se a Independente (e outras do mesmo género) e a espécie de licenciaturas que providenciava. Comercialmente era sucesso assegurado e repare-se que nem sequer era ilegal ou fraudulento em termos legais.

Entretanto os tempos mudaram, estamos em tempo de exigência e qualificação. Qualidade é o mote. Vem aí o MIT senhores engenheiros e "engenheiros". O que fará Mariano Gago neste contexto?

Será que Gago, professor catedrático do Instituto Superior Técnico, pesará que o novo reitor da Independente é doutorado há seis meses! Este último deve ser também um génio, um doutoramento pela prestidigitadíssima universidade de Badajoz (Deus meu). Será que não havia mais ninguém depois de, sobre os outros, pesarem acusações gravíssimas com detenções à mistura. E o pai do Satélite? Carvalho Rodrigues, que com a sua figura imponente emprestou fama mediática àquela que era a "sua universidade"... onde pára o Senhor Pai do Satélite? Em Bruxelas... e não fala. "Agora não fala", os alunos que se desenrasquem.

Feche-se o que nunca se deveria ter aberto. E depressa.

Sócrates e o canudo

Sobre José Sócrates: não há livros de termos, não há validação por conselho científico, não há comissão de equivalências, não há registos oficiais, não há cadeiras, não há licenciados nesse ano (de 1996), não há nada, perdão, ... há um certificado passado a um domingo! Há uns telefonemas aos jornalistas. Afinal por que se preocupa o PM com um curso da treta tirado numa universidade que todo a gente sabe ser da treta? Quem elegeu José Sócrates perguntou-lhe onde tinha tirado o canudo? Será que o único a achar importância ao assunto foi Sócrates? Será que só ele não percebeu que o canudo da Independente ou um curso da catequese dos escuteiros do Fundão são quase a mesma coisa? Será que não percebeu que o problema da credibilidade entre o meio académico das suas prrogativas lectivas estava resolvido há muito tempo? Mas o meio académico é o meio académico e o resto do país está-se nas tintas. Salazar era Doutor, Sócrates tem o curso da Independente. Agora os telefonemas, esses sim, cheiram que tresandam a doutoramento em intriga política escola PS, algures na Beira Baixa.

Não há volta a dar-lhe. Creio até que teria demonstrado muito mais engenho se o Sócrates tivesse mesmo tirado o curso sem por lá os pés, como o Einstein. Agora andar a enganar-se a ele próprio, ir de motorista oficial a altas horas da noite aturar uns manhosos duns professores como o Arouca e os outros (ao menos o Santana andava a beber uns bons copos) para ter o certificado passado a um domingo e sem livro de termos? Sem poder inscrever-se na Ordem? Mas que falta de profissionalismo. Ao menos que arranjasse um doutoramento honoris causa, como o outro, isso é que era engenho. Um homem cujo sonho era ser engenheiro, como o Guterres que tirou o curso no Técnico e teve vinte a análise para depois não saber qual era o PIB. Pobre Sócrates que andou a ser enganado este tempo todo, é de meter dó: encontou-se a autêntica vítima de uma cabala.

Aditamento

Depois de escrever este post, Mariano Gago anunciou o encerramento compulsivo (mas provisório) da Independente. Aplaude-se a decisão corajosa (mas provisória), a única a tomar por alguém que tem, além de inteligência, um currículo académico e científico exemplar. Não havia volta a dar (provisoriamente).

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1.4.07

Festival de Páscoa de Salzburg 

E cá estamos em Salzburg, ontem com um Ouro do Reno magnificente pela Filarmónica de Berlim e sob a batuta de Rattle, o mesmo Ouro de Aix de Stéphane Braunschweig, mas muito mais apurado em termos musicais e teatrais. Simplesmente de ir às lágrimas...

Hoje continua com a Filarmónica e Rattle para um concerto que culmina com Brahms, para o fim da semana Lang Lang e mais filarmónica e alguns concertos de câmara no Mozarteum. Ficam prometidas críticas.

A Primavera aqui está deslumbrante de calor e verde.

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